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Àquela multidão que segue o Senhor, depois da multiplicação dos pães e dos peixes, Jesus disse: em verdade, em verdade vos digo que me buscais, não por causa dos milagres que vistes, mas porque vos alimentei com aqueles pães até ficardes saciados91. Os milagres que o Senhor realiza têm essa finalidade principal: revelar a sua divindade, para que tenhamos fé. Então, perguntaram-lhe: o que faremos, para nos exercitarmos nas obras de Deus? Jesus respondeu: a obra de Deus é que creiais naquele que Ele vos enviou. Disseram-lhe: que milagres fazes, para que vejamos e acreditemos? Que coisas fazes?92

Se falta a vontade de crer, a disposição humilde da alma, não se veem os prodígios de Deus; a inteligência move-se num plano sem relevo, sem o sentido sobrenatural. Por isso, quando Jesus lhes fala do Pão da Vida, da Eucaristia, continuam pensando no pão da terra. Disseram-lhe: Senhor, dá-nos sempre desse pão93. E quando lhes propõe o mistério em que devem crer, em seus termos precisos, sem possibilidade de tergiversar seu conteúdo sobrenatural objetivo, quando lhes exige o ato de fé teologal — dando-lhes a graça suficiente para crer —, produz-se a debandada. Desde então, muitos de seus discípulos deixaram de segui-lo e não andavam mais com ele. Por isso, Jesus disse aos doze: vocês também querem ir embora? Então, Simão Pedro lhe respondeu: Senhor, a quem iremos? Tu tens palavras de vida eterna. E nós conhecemos e cremos que tu és o Cristo, o Filho de Deus94.

Agora peço, para vós e para mim, a fé de Pedro, quae per caritatem operatur95, que atua animada pela caridade. Uma fé viva, inquebrantável, sem vacilações, sem atenuar o seu conteúdo, sem qualquer sombra, operativa.

Constantes, alegres, retificando um pouco a cada dia, como fazem os navios em alto-mar para chegar ao porto. Os santos foram como nós: tiveram a boa vontade e a sinceridade de retificar na sua vida interior, na sua luta: com vitórias e derrotas, que às vezes são vitórias; buscando relacionar-se com Deus, que é esperança, que é fé, que é Amor. Nosso Deus está contente com essa nossa luta, que é um sinal seguro de que temos vida interior, desejo de perfeição cristã.

Lembrai-vos de quando João e Tiago se aproximaram de Jesus e disseram: Mestre, gostaríamos que nos concedesse tudo o que lhe pedirmos. Ele disse-lhes: O que quereis que vos conceda? Concede-nos, eles responderam, que em tua glória possamos sentar um à tua direita e outro à tua esquerda. Jesus respondeu-lhes: Podeis beber o cálice que eu vou beber, ou ser batizado com o batismo com o qual eu vou ser batizado? Eles responderam: Possumus, podemos107. O caminho da Glória passa pela estreiteza da morte. Não sabeis que nós, que fomos batizados em Jesus Cristo, fomos batizados em virtude de sua morte? No Batismo fomos sepultados com Ele, morrendo para o pecado, a fim de que, assim como Cristo ressuscitou dos mortos para a glória do Pai, assim também nós procedamos segundo uma vida nova108.

Meus filhos, digamos com João e Tiago: possumus!Omnia possum in eo qui me confortat109; tudo posso naquele que me conforta. Enchei-vos de confiança, porque aquele que começou a obra a aperfeiçoará110: poderemos se cooperarmos, porque temos assegurada a fortaleza de Deus: quia tu es, Deus, fortitudo mea111.

Nossa pedagogia é feita de afirmações, não de negações, e se reduz a duas coisas: agir com sentido comum e com sentido sobrenatural. Entre outras manifestações dessa pedagogia, há uma que pode ser assim expressa: muita confiança em Deus, confiança nos outros e desconfiança de nós mesmos. Não confieis facilmente no próprio juízo: como o metal precioso precisa ser provado — necessita da pedra de toque —, nós temos de ver se o nosso julgamento é ouro fino — no humano e no sobrenatural — levando em conta o parecer dos outros, sobretudo daqueles que têm graça de estado para nos ajudar. É por isso que devemos ter a boa disposição de retificar o que tenhamos afirmado anteriormente. Retificar não é uma humilhação: é um ato cheio de retidão, que está dentro daquela pedagogia sobrenatural.

O bem sobrenatural de uma só pessoa é melhor do que o bem natural de todo o universo112. Devemos pedir a Deus que coloque sempre essa fé e visão sobrenatural em nossa inteligência, que confira uma hierarquia objetiva às nossas ideias, aos nossos afetos e às nossas obras. É preciso pedir esse critério, porque é um dom de Deus.

Notas
91

Jo 6, 26.

92

Jo 6, 28-30.

93

Jo 6, 34.

94

Jo 6, 67-70.

95

Gl 5, 6.

Referências da Sagrada Escritura
Notas
107

Cf. Mc 10, 35-39; “possumus”: “podemos”.

108

Rm 6, 3-4.

109

Fl 4, 13.

110

Fl 1, 6.

111

Sl 43 [42], 2; “quia tu es, Deus, fortitudo mea”: “porque tu és, Deus, a minha fortaleza”.

Referências da Sagrada Escritura
Notas
112

S.Th. I-II, q. 113, a. 9 ad 2.