Lista de pontos
Introdução
Depois desta oração preparatória, que é um ato de fé, que é um ato de amor a Deus, um ato de arrependimento, um ato de esperança – «creio firmemente que estás aqui, que me vês, que me ouves; adoro-Te com profunda reverência, peço-Te perdão dos meus peca- dos» –, que é uma ação de graças, que é um ato de devoção à Mãe de Deus... Depois desta oração preparatória, que é já oração mental, vamos entrar, como todas as manhãs, como todas as tardes, numa consideração que nos leve a ser melhores.
Meus filhos, hoje, que começa um novo ano litúrgico com um tempo cheio de afeto para com o Redentor, é um bom dia para recomeçarmos. Recomeçar? Sim, recomeçar. Eu – imagino que tu também – recomeço todos os dias, a todas as horas, recomeço cada vez que faço um ato de contrição.
«Ad te, Domine, levavi animam meam; Deus meus, in te confido, non erubescam»1: a Ti, Senhor, elevei a minha alma; meu Deus, confio em Ti, não serei envergonhado. Esta confiança no Senhor é a fortaleza do Opus Dei. Ao longo de muitos anos, foi esta a nossa oração, nos momentos de incompreensão, de uma incompreensão quase brutal: «Non erubescam!». Mas os incompreendidos não somos apenas nós. Todas as pessoas, físicas e morais, padecem incompreensão. Não há ninguém no mundo que, com razão ou sem ela, não diga que é um incompreendido: incompreendido pela família, pelos amigos, pelos vizinhos, pelos colegas... Mas, se tiver retidão de intenção, dirá imediatamente: «Ad te levavi animam meam», e continuará, com o salmista: «Etenim universi, qui te exspectant, non confundentur»3: porque os que esperam em Ti não serão confundidos.
«In te confido». Já não se trata de incompreensão, mas de pessoas que odeiam, da má intenção de alguns. Há uns anos não acreditava, mas agora acredito: «Neque irrideant me inimici mei»2. Meu filho, filho da minha alma, dá graças ao Senhor porque pôs na boca do salmista essas palavras, que nos enchem de sólida fortaleza. E pensa nas vezes em que te sentiste perturbado, em que perdeste a tranquilidade, porque não soubeste recorrer ao Senhor – «Deus tuus»: teu Deus – e confiar nele: essa gente não fará chacota de ti.
Depois, nessa luta interna da alma, e naquela outra pela glória de Deus, para promover apostolados eficazes ao serviço de Deus e das almas, da Igreja, nessas lutas, fé, confiança! Mas, Padre – dir-me-ás –, e os meus pecados? E eu respondo-te: e os meus? «Ne respicias peccata mea, sed fidem»3. E recordaremos as palavras da Escritura: «Quia tu es, Deus, fortitudo mea»4. Já não tenho medo porque Tu, Senhor, olhas mais para minha fé do que para as minhas misérias, e és a minha fortaleza; porque estes meus filhos – apresento-vos a todos a Deus – são também a minha fortaleza. Fortes, decididos, seguros, serenos, vitoriosos!
Mas humildes, humildes. Porque conhecemos muito bem o barro de que somos feitos, e detetamos pelo menos um bocadinho da nossa soberba, e um bocadinho da nossa sensualidade... E não sabemos tudo. Descubramos o que estorva a nossa fé, a nossa esperança e o nosso amor! E teremos serenidade. Numa palavra, vislumbraremos que somos mais filhos de Deus, e seremos capazes de seguir em frente neste novo ano. Sentir-nos-emos filhos do Pai, do Filho, do Espírito Santo.
Certamente, o Senhor ensinou-nos o caminho para o Céu; e, tal como deu ao profeta aquele pão cozido sob as cinzas5, também no-lo deu a nós, para continuarmos em frente pelo caminho. Um caminho que pode ser do homem santo ou do homem tíbio, ou – nem quero pensar nisso – do homem mau. «Vias tuas, Domine, demonstra mihi; et semitas tuas edoce me»6: mostra-me, Senhor, os teus caminhos e ensina-me as tuas sendas. O Senhor ensinou-nos o caminho da santidade. Queres pensar um pouco em tudo isto?
17. Excita, quaesumus, Domine, potentiam tuam et veni
«Excita, quaesumus, Domine, potentiam tuam, et veni»7: Senhor, demonstra o teu poder e vem.
Que bem nos conhece a Igreja, a liturgia, que é oração da Igreja! Repara como conhece o teu desejo e o meu, o teu modo de ser e o meu. «Excita, Domine, potentiam tuam et veni». O poder de Deus vem até nós. É o Deus absconditus que passa, mas que não passa inutilmente.
Vem, Jesus, «para que com a tua proteção mereçamos ser livres dos perigos que nos ameaçam pelos nossos pecados, e sejamos salvos pela tua graça»8 . Dá graças ao Senhor, nosso protetor e libertador. Não penses agora se as tuas faltas são grandes ou pequenas; pensa no perdão, que é sempre muito grande. Pensa que a culpa poderia ter sido enorme e dá graças, porque Deus teve – e tem – esta disposição de perdoar.
Filho, este começo do Advento é uma hora propícia para fazermos um ato de amor; para dizermos «creio», para dizermos «espero», para dizermos «amo», para nos dirigirmos à Mãe do Senhor – Mãe, Filha, Esposa de Deus, nossa Mãe – e lhe pedirmos que nos obtenha mais graças da Santíssima Trindade: a graça da esperança, do amor, da contrição. Para que quando, por vezes, na vida, parece soprar um vento forte, um vento seco, capaz de fazer murchar as flores da alma, as nossas não murchem.
E aprende a louvar o Pai, o Filho e o Espírito Santo. Aprende a ter uma devoção particular à Santíssima Trindade: creio em Deus Pai, creio em Deus Filho, creio em Deus Espírito Santo, creio na Santíssima Trindade. Espero em Deus Pai, espero em Deus Filho, espero em Deus Espírito Santo, espero na Santíssima Trindade. Amo a Deus Pai, amo a Deus Filho, amo a Deus Espírito Santo, amo a Santíssima Trindade. Esta devoção faz falta como exercício sobrenatural, que se traduz nestes movimentos do coração, embora nem sempre se traduza em palavras.
São horas de trabalhar!
Sabemos muito bem o que hoje nos diz São Paulo: «Fratres, scientes quia hora est iam de somno surgere»9. São horas de trabalhar! De trabalhar por dentro, na edificação da nossa alma; e por fora, na edificação do Reino de Deus. E a contrição vem novamente aos nossos lábios: Senhor, peço-te perdão pela minha vida má, pela minha vida tíbia; peço-te perdão pelo meu trabalho mal feito; peço-te perdão porque não soube amar-Te, e por isso não soube estar atento a Ti. Um olhar depreciativo de um filho a sua mãe causa-lhe uma dor imensa; se for um estranho, não a incomoda especialmente. Eu sou teu filho: mea culpa, mea culpa!...
«Sabei que são horas de acordar do sono». Com que sentido sobrenatural vemos as coisas? Esse sentido não se nota por fora, mas manifesta-se nas ações, às vezes até pelo olhar. Deves olhar muito para dentro de ti. Não é verdade que houve algum sono na tua vida? Alguma superficialidade? Pensa como facilitamos, cumprindo sem demasiado amor. Cumprir!
«Nox praecessit, dies autem appropinquavit; abiiciamus ergo opera tenebrarum, et induamur arma lucis»10: rejeitemos, pois, as obras das trevas, e revistamo-nos das armas da luz. O apóstolo tem muita força! «Sicut in die honeste ambulemus»11. Devemos caminhar pela vida como apóstolos, com luz de Deus, com sal de Deus. Com naturalidade, mas com tal vida interior, com tal espírito do Opus Dei, que demos luz, que evitemos a corrupção que existe ao nosso redor, que levemos como fruto a serenidade e a alegria. E, no meio das lágrimas – porque às vezes se chora, mas não faz mal –, a alegria e a paz, o gaudium cum pace.
Sal, fogo, luz; pelas almas, pela tua e pela minha. Um ato de amor, de contrição. Mea culpa... Eu podia, eu devia ter sido instrumento... Dou-te graças, meu Deus, porque, apesar de tudo, me deste uma grande fé, e a graça da vocação, e a graça da perseverança. Por isso, a Igreja põe nos nossos lábios, na Santa Missa: «Dominus dabit benignitatem, et terra nostra dabit fructum suum»12. Essa bênção de Deus é a origem dos frutos bons, daquele clima que é necessário para que, na nossa vida, possamos tornar-nos santos e cultivar santos, filhos seus.
«Dominus dabit benignitatem...». Nosso Senhor espera fruto. Se não o dermos, estaremos a tirar-Lho. Mas não quer um fruto raquítico, desmedrado, por não termos sido generosos. O Senhor dá a água, a chuva, o sol, essa terra... Mas espera a sementeira, o transplante, a poda; espera que guardemos os frutos com amor, evitando, se for preciso, que venham os pássaros do céu e os comam.
Vamos terminar, recorrendo à nossa Mãe, para que nos ajude a cumprir os propósitos que fizemos.
Por Cristo, à Santíssima Trindade
Mais tarde, a alma precisa de chegar ao trato com cada uma das Pessoas divinas. É uma descoberta, como as que faz um menino pequeno na vida terrena, essa que a alma realiza na vida sobrenatural. E começa a falar com o Pai e com o Filho e com o Espírito Santo; e a sentir a atividade do Paráclito vivificador, que Se nos dá sem que o mereçamos: os dons e as virtudes sobrenaturais! E, sem disso nos apercebermos, chegamos de algum modo à união.
Fomos «quemadmodum desiderat cervus ad fontes aquarum»9: como o cervo que anseia pelas fontes das águas, com sede, gretada a boca, com secura. Queremos beber nesse manancial de água viva. E, sem fazer coisas estranhas, ao longo do dia, com a formação que se recebe na Obra – que se baseia em descomplicar a alma humana –, chega-se a esse abundante e claro veio de frescas linfas que brotam para a vida eterna10. Então, já não se fala, porque a língua não sabe expressar-se; já o entendimento se aquieta. Não se fala, fita-se! E a alma não se contém e canta, porque se sente e se sabe amorosamente olhada por Deus em todos os momentos.
Não sabeis o consolo que senti quando, depois de repetir durante anos e anos que, para uma alma contemplativa, até o sono é oração, encontrei um texto de São Jerónimo que diz o mesmo.
Só com uma dedicação completa – dentro das nossas imperfeições, com a humilhação dos nossos fracassos internos, que nos levam a voltar todos os dias para Deus – se consegue regressar ao caminho principal quando há obstáculos. Tenho-vo-lo dito muitas vezes: eu faço constantemente o papel de filho pródigo. É esse o momento da contrição, do amor, da fusão da criatura, que é nada, com o seu Deus e o seu amor, que é tudo.
Meus filhos, não vos falo de coisas extraordinárias. São, têm de ser, fenómenos ordinários da nossa alma. E é por aí que deveis levar os vossos irmãos: até essa loucura de amor que ensina a saber sofrer e a saber viver, porque Deus nos concede o dom da sabedoria. Que serenidade, que paz, se alcança então!
Ascética? Mística? Não saberia dizer. Seja o que for, ascética ou mística, tanto faz: é um dom de Deus. Se procurares meditar, chegará um momento em que o Senhor não te negará os seus dons; ser-te-ão concedidos pelo Espírito Santo. Fé, meus filhos, e obras de fé. Porque isso já é contemplação e é união. E esta é a vida dos meus filhos no meio dos afãs do mundo, mesmo que nem sequer se apercebam disso. Um tipo de oração e de vida que não nos afasta das coisas da Terra, que, no meio delas, nos leva a Deus. E, ao levar as coisas terrenas a Deus, a criatura diviniza o mundo. Falei tantas vezes do mito do rei Midas...! Convertemos em ouro tudo aquilo em que tocamos, apesar dos nossos erros pessoais.
É sempre tempo de lutar
Então o Padre quer que caiamos e que erremos? Não, meus filhos. Como hei de querer uma coisa dessas! Mas se alguma vez, por fraqueza humana, cairdes de bruços, não desanimeis. Seria uma reação de soberba pensar, numa altura dessas: «Eu não sirvo». É claro que serves! E vales todo o sangue de Cristo. «Empti enim estis pretio magno»1: fostes comprados por um grande preço. Aproximai-vos imediatamente do sacramento da penitência, falai sinceramente com o vosso irmão, e recomeçai!, que Deus conta convosco para fazer a sua Obra.
Não vos entristeçais se, nos momentos mais maravilhosos da vossa vida, sentis a tentação – que talvez possais confundir com um desejo consentido, mas que não o é – das maiores fealdades que é possível imaginar. Recorrei à misericórdia do Senhor, contando com a intercessão de sua Mãe e Mãe nossa, e tudo se conserta. Depois, desatai a rir: Deus trata-me como se fosse um santo! Não tem importância nenhuma; persuadi-vos de que a criatura velha que todos trazemos dentro de nós pode levantar-se em qualquer momento. Contentes, e a lutar como sempre! Agora que ninguém quer falar de batalhas nem de guerras, não temos outro remédio senão recordar aquelas palavras da Sagrada Escritura: «Militia est vita hominis super terram»2. Se bem que a vossa luta, minhas filhas e meus filhos, se fizerdes caso destes conselhos do vosso Padre – que tem muita experiência das fraquezas humanas, por ser sacerdote, pela idade e pelo conhecimento que tem de si próprio –, será geralmente uma pequena guerra, uma luta em coisas sem demasiada importância, bem longe dos muros capitais da fortaleza.
De vez em quando, talvez encontreis mais violência, mais força na soberba e nas coisas que puxam para o barro. Nessa altura, a maior loucura que podereis cometer será calar-vos. «Enquanto permaneci calado», reza um dos salmos, «os meus ossos consumiam-se em gemidos durante o dia todo, pois a tua mão pesava sobre mim dia e noite, e o meu vigor converteu-se em secura de estio»3. Em contrapartida, tudo se consertará se falardes, se contardes as vossas dificuldades, erros e misérias nessa conversa pessoal, íntima e fraterna, que há em Casa, e na confissão. Falai claramente antes, filhos da minha alma, quando notardes o primeiro sintoma, ainda que seja muito leve, ainda que pareça não ter importância. Falai claramente e pensai que não fazer assim é encher-se de rubores tolos e de trejeitos de noviça, quando tendes a obrigação de vos portardes valentemente, como soldados. Não me refiro só às fraquezas da carne, embora também as inclua, mas no seu sítio, em quinto ou sexto lugar. Refiro-me sobretudo à soberba, que é o nosso maior inimigo, o que nos faz andar tresloucados.
Não vos admireis, portanto, se alguma vez cometerdes uma tolice. Mostrai a ferida, a chaga, e deixai agir quem vos cure, ainda que doa. Assim, recuperareis a saúde, seguireis em frente e a vossa vida traduzir-se-á num grande bem para as almas.
O nosso Deus é tão sumamente bom que, por pouco que lutemos, responde inundando-nos com a sua graça. O Senhor, com o seu coração de Pai – maior que todos os nossos corações juntos –, é omnipotente e quer-nos a todos perto dele; a sua alegria – «as suas delícias são estar com os filhos dos homens»4 – consiste em cumular de alegria os que se aproximam dele. E sabeis como nos aproximamos de Deus? Com atos de contrição, que nos purificam e nos ajudam a ser mais limpos.
Temos de nos comportar como um menino que se sabe com a cara suja e decide lavar-se, para que a mãe lhe dê dois beijos. Se bem que, no caso da alma contrita, é Deus quem nos purifica e, depois e entretanto, como uma mãe, não ralha connosco, mas pega em nós ao colo, ajuda-nos, aperta-nos contra o peito, vem ao nosso encontro, limpa-nos e concede-nos a sua graça, a vida, o Espírito Santo. Não só nos perdoa e nos consola, se recorrermos a Ele com boas disposições, como nos cura e nos alimenta.
O sacramento do perdão
É preciso voltar para Deus quanto antes; voltar, voltar sempre. Eu volto muitas vezes por dia, e há semanas em que me confesso duas vezes; às vezes uma, outras vezes três, sempre que preciso, para minha tranquilidade. Não sou beato nem escrupuloso, mas sei o que é bom para a minha alma.
Agora, há em muitos sítios gente sem piedade nem doutrina que aconselha as pessoas a não se confessarem; atacam o santo sacramento da penitência da maneira mais brutal. Pretendem fazer uma comédia: umas palavrinhas, todos juntos, e depois a absolvição. Não, meus filhos! Amai a confissão auricular! E não somente dos pecados graves, mas também dos pecados leves, e mesmo das faltas. Os sacramentos conferem a graça ex opere operato: pela própria virtude do sacramento, e também ex opere operantes: conforme as disposições de quem os recebe. A confissão, além de ressuscitar a alma e a limpar das misérias que tenha cometido – por pensamentos, desejos, palavras ou ações –, produz um aumento da graça, robustece-nos, proporciona-nos mais armas para alcançarmos a vitória interior, pessoal. Amai o santo sacramento da penitência!
Já vistes manifestação mais grandiosa da misericórdia de Nosso Senhor? Deus Criador enche-nos de admiração e agradecimento. Deus Redentor comove-nos. Um Deus que fica na eucaristia, feito alimento por amor de nós, enche-nos de ânsias de corresponder. Um Deus que vivifica e dá sentido sobrenatural a todas as nossas ações, instalado no centro da nossa alma em graça, é inefável. Um Deus que perdoa... é uma maravilha! Quem fala contra o sacramento da penitência está a pôr entraves a esse prodígio da misericórdia divina. Tenho observado, meus filhos, que muitos que não conheciam a Cristo, quando sabem que nós, os católicos, temos um Deus que compreende as fraquezas humanas e as perdoa, se sentem abalados e pedem que lhes expliquem a doutrina de Jesus.
Aqueles que procuram evitar que agradeçamos ao Senhor a instituição deste sacramento, se conseguissem o seu propósito, nem que fosse numa pequena parte, destruiriam a espiritualidade da Igreja. Se me perguntardes: Padre, eles dizem coisas novas?, tenho de vos responder: nenhuma, meus filhos. O diabo repete-se uma vez e outra: são sempre as mesmas coisas. O diabo é muito esperto, porque foi anjo e porque é muito velho, mas, ao mesmo tempo, é rematadamente tonto; falta-lhe a ajuda de Deus e não faz senão repetir de modo massacrante as mesmas coisas. Todos os erros que agora se propagam, todos esses modos de mentir e dizer heresias, são velhos, muito velhos, e foram mil vezes condenados pela Igreja.
Aqueles que afirmam não entender a necessidade da confissão oral e secreta, não será porque não querem mostrar a peçonha que trazem dentro de si? Não serão desses que vão ao médico e não querem dizer há quanto tempo estão doentes, quais os sintomas da sua doença, onde lhes dói? São loucos! Essas pessoas precisam de ir a um veterinário, porque são como os animais: não falam.
Sabeis porque acontecem estas coisas na Igreja? Porque há muitos que não praticam o que pregam; ou que ensinam falsidades e, portanto, comportam-se de acordo com o que dizem. Continua a ser necessário aplicar meios ascéticos para levar uma vida cristã; nisto, não houve progresso, nem haverá jamais: «Iesus Christus, heri et hodie, ipse et in sæcula!»5: Jesus Cristo é o mesmo ontem e hoje, e sê-lo-á sempre. Não se pode alcançar um fim sem utilizar os meios adequados. E, na vida espiritual, os meios foram, são e serão sempre os mesmos: o conhecimento da doutrina cristã, a receção frequente dos sacramentos, a oração, a mortificação, a vida de piedade, a fuga das tentações – e das ocasiões –, e abrir o coração para que a graça de Deus entre até ao fundo e se possa abrir a ferida, cauterizá-la, limpá-la e purificá-la.
Na Terra e no Céu
Faço por chegar à Trindade do Céu pela trindade da Terra: Jesus, Maria e José. É como se estivessem mais acessíveis. Jesus, que é perfectus Deus e perfectus Homo8. Maria, que é uma mulher, a mais pura criatura, a maior; mais do que Ela, só Deus. E José, que vem logo depois de Maria, limpo, varonil, prudente, íntegro. ó meu Deus, que modelos! Só de olhar para eles, dá-me vontade de morrer de pena, porque eu, Senhor, tenho-me portado tão mal... Não tenho sabido estar à altura das circunstâncias, divinizar-me. E Tu deste-me todos os meios; e dás- -mos, e continuarás a dar-mos... Porque é à maneira divina que temos de viver humanamente na Terra.
Temos de estar – e tenho consciência de vo-lo ter dito muitas vezes – sempre no Céu e na Terra. Não é entre o Céu e a Terra, porque somos do mundo, mas no mundo e no Paraíso ao mesmo tempo! Esta é a fórmula, por assim dizer, que exprime de que modo devemos compor a nossa vida enquanto permanecemos in hoc sæculo9. No Céu e na Terra, endeusados; mas sabendo que somos do mundo e que somos terra, com a fragilidade própria do que é terra: um pote de barro que o Senhor Se dignou aproveitar para o seu serviço. E, quando ele se quebrou, recorremos aos famosos grampos, como o filho pródigo: «Pequei contra o Céu e contra Ti...»10. Quer se tratasse de uma coisa de vulto, quer de algo pequeno. Às vezes, dói-nos muito, muito, uma falha pequena, um desamor, um não saber olhar para o Amor dos amores, um não saber sorrir. Porque, quando se ama, não há coisas pequenas; tudo tem muita importância, tudo é grande, mesmo numa criatura miserável e pequena como eu, como tu, meu filho.
O Senhor quis depositar em nós um tesouro riquíssimo. Estou a exagerar? Não, disse pouco. Disse pouco agora, porque antes disse mais. Recordei que em nós habita Deus, Senhor Nosso, com toda a sua grandeza. Nos nossos corações há habitualmente um Céu. E não vou continuar.
Gratias tibi, Deus, gratias tibi, vera et una Trinitas, una et summa Deitas, sancta et una Unitas!11
Que a Mãe de Deus seja para nós Turris Civitatis12iii, a torre que vela pela cidade; a cidade que é cada um, com muitas coisas que vão e vêm dentro de nós, com muito movimento e ao mesmo tempo com tanta quietude; com tanta desordem e com tanta ordem; com tanto ruído e com tanto silêncio; com tanta guerra e com tanta paz.
Sancta Maria, Turris Civitatis, ora pro nobis!
Sancte Joseph, Pater et Domine, ora pro nobis!
Sancti angeli custodes, orate pro nobis!13
Missal Romano, I Domingo do Advento, antífona de entrada
(Sl 24,1-2) 3 Ibid.
Ibid.: «Não se riam de mim os meus inimigos».
Missal Romano, Ordinário da Missa: «Não olheis aos nossos pecados, mas à fé».
Sl 42, 2: «Porque Tu és, ó Deus, a minha fortaleza».
1Rs 19, 6-8.
Missal Romano, I Domingo do Advento, antífona de entrada (Sl 24, 4).
Missal Romano, I Domingo do Advento, leitura (Rom 13, 11):
«Irmãos, sabeis que são horas de acordar do sono».
Ibid. (Rom 13, 12): «A noite vai passando e aproxima-se o dia; rejeitemos, pois, as obras das trevas, e revistamo-nos das armas da luz».
Ibid. (Rom 13, 13): «Como quem anda de dia, andemos decentemente».
Missal Romano, I Domingo do Advento, antífona da comunhão (Sl 84, 13): «O Senhor nos dará a sua bênção e a nossa terra dará muito fruto».
Passagem do Símbolo Atanasiano: «perfeito Deus, perfeito Homem».
Neste mundo.
Lc 15, 21.
Obrigado, meu Deus, obrigado, Trindade una e verdadeira, Deus sumo e uno, Unidade una e santa!
iii Alusão a Nossa Senhora de Torreciudad, cujo santuário – promovido por São Josemaria – estava nessa altura a ser construído em Aragão, estando quase concluído (N. do E.).
Santa Maria, Torre da Cidade, rogai por nós! São José, Pai e Senhor, rogai por nós! Santos anjos da guarda, rogai por nós!
Documento impresso de https://escriva.org/pt-br/book-subject/en-dialogo-con-el-se%C3%B1or/28437/ (20/11/2025)