Lista de pontos
São horas de trabalhar!
Sabemos muito bem o que hoje nos diz São Paulo: «Fratres, scientes quia hora est iam de somno surgere»9. São horas de trabalhar! De trabalhar por dentro, na edificação da nossa alma; e por fora, na edificação do Reino de Deus. E a contrição vem novamente aos nossos lábios: Senhor, peço-te perdão pela minha vida má, pela minha vida tíbia; peço-te perdão pelo meu trabalho mal feito; peço-te perdão porque não soube amar-Te, e por isso não soube estar atento a Ti. Um olhar depreciativo de um filho a sua mãe causa-lhe uma dor imensa; se for um estranho, não a incomoda especialmente. Eu sou teu filho: mea culpa, mea culpa!...
«Sabei que são horas de acordar do sono». Com que sentido sobrenatural vemos as coisas? Esse sentido não se nota por fora, mas manifesta-se nas ações, às vezes até pelo olhar. Deves olhar muito para dentro de ti. Não é verdade que houve algum sono na tua vida? Alguma superficialidade? Pensa como facilitamos, cumprindo sem demasiado amor. Cumprir!
«Nox praecessit, dies autem appropinquavit; abiiciamus ergo opera tenebrarum, et induamur arma lucis»10: rejeitemos, pois, as obras das trevas, e revistamo-nos das armas da luz. O apóstolo tem muita força! «Sicut in die honeste ambulemus»11. Devemos caminhar pela vida como apóstolos, com luz de Deus, com sal de Deus. Com naturalidade, mas com tal vida interior, com tal espírito do Opus Dei, que demos luz, que evitemos a corrupção que existe ao nosso redor, que levemos como fruto a serenidade e a alegria. E, no meio das lágrimas – porque às vezes se chora, mas não faz mal –, a alegria e a paz, o gaudium cum pace.
Sal, fogo, luz; pelas almas, pela tua e pela minha. Um ato de amor, de contrição. Mea culpa... Eu podia, eu devia ter sido instrumento... Dou-te graças, meu Deus, porque, apesar de tudo, me deste uma grande fé, e a graça da vocação, e a graça da perseverança. Por isso, a Igreja põe nos nossos lábios, na Santa Missa: «Dominus dabit benignitatem, et terra nostra dabit fructum suum»12. Essa bênção de Deus é a origem dos frutos bons, daquele clima que é necessário para que, na nossa vida, possamos tornar-nos santos e cultivar santos, filhos seus.
«Dominus dabit benignitatem...». Nosso Senhor espera fruto. Se não o dermos, estaremos a tirar-Lho. Mas não quer um fruto raquítico, desmedrado, por não termos sido generosos. O Senhor dá a água, a chuva, o sol, essa terra... Mas espera a sementeira, o transplante, a poda; espera que guardemos os frutos com amor, evitando, se for preciso, que venham os pássaros do céu e os comam.
Vamos terminar, recorrendo à nossa Mãe, para que nos ajude a cumprir os propósitos que fizemos.
O milagre da multiplicação
Disse-vos tantas vezes, meus filhos – e vós repetiste-o outras tantas –, que Deus Nosso Senhor, na sua providência amorosíssima, no carinho que tem pelos homens – «delitiæ meæ esse cum filiis hominum»7: as suas delícias são estar com os filhos dos homens –, quis, de algum modo, que fôssemos corredentores com Ele. Por isso, para nos ajudar a compreender esta maravilha, levou o evangelista a relatar com todo o detalhe este grande prodígio. Ele podia tirar o pão de onde quisesse, porque «minhas são todas as criaturas dos bosques e os milhares de animais dos montes. E na minha mão estão todas as aves dos céus e todos os animais do campo [...], meu é o mundo e tudo quanto nele existe»8. Mas não. Procurou a cooperação dos homens.
«Um dos seus discípulos, André, irmão de Simão Pedro, disse-lhe: “Está aqui um jovem que tem cinco pães de cevada e dois peixes; mas que é isso para tanta gente?”»9. Ele precisa de um menino, de um rapaz, de uns pedaços de pão e de uns peixes. Tu e eu fazemos-Lhe falta, meu filho: e é Deus! Isto urge-nos a ser generosos na nossa correspondência. Ele não precisa de nenhum de nós para nada, e – ao mesmo tempo – precisa de todos nós. Que maravilha! Pede-nos o pouco que somos, o pouco que valemos, os nossos parcos talentos, e não Lhos podemos regatear. Os dois peixes, o pão: tudo.
Cada um deve perguntar agora a si próprio: que fiz com os meus sentidos até este momento? Que fiz com as minhas potências: com a memória, com o entendimento, com a vontade? Só a meditação desta frase levar-nos-ia horas. Que haveremos de fazer com todo o nosso ser, daqui em diante? É natural que venha à nossa mente o pensamento de tantas coisas que não fizemos bem e que talvez ainda não façamos. Por isso, digo-te: meu filho, tens desejos de retificação, de purificação, de mortificação, de um trato mais frequente com o Senhor, de aumentar a tua piedade, sem teatro nem coisas exteriores, com naturalidade? Porque tudo isso faz aumentar a eficácia da Obra, na nossa alma e na de todos os homens. Se te detiveres num exame da tua vida mais recente, ser-te-á mais fácil seguir as considerações que faço em voz alta, em vosso nome e no meu.
Então, Jesus disse: «Mandai sentar a multidão»10. Os discípulos sabiam que Jesus desejava dar de comer àquela multidão, mas não tinham dinheiro: «Duzentos denários de pão não bastam para cada um deles receber um bocado»11. Não tinham muito nem pouco dinheiro, e precisariam de um capital imenso para dar de comer àquela multidão. O Senhor resolve a situação: «Mandai sentar a multidão. Havia ali muita relva. Sentaram-se, pois, em número de uns cinco mil homens»12. Cinco mil! Ouvem a voz do Senhor e todos obedecem, todos, todos!, a começar pelos discípulos.
Como anda às vezes a obediência por aí...! Que pena! Querem questionar tudo. Mesmo na vida de entrega a Deus, há pessoas para quem tudo é ocasião de disquisições: se os superiores podem mandar isto, se podem mandar aquilo, se podem mandar aqui, se podem mandar acolá... No Opus Dei, sabemos isto: pode-se mandar tudo – com o máximo respeito pela liberdade pessoal em matérias políticas e profissionais –, desde que não seja ofensa a Deus.
Ânsia de santidade
Chegámos ao terceiro ponto da nossa meditação e, neste terceiro ponto, não sou eu que vos proponho determinadas considerações; sois vós que deveis encarar-vos de frente, já que o Senhor nos escolheu para a mesma finalidade, e em vós e em mim nasceu toda esta maravilha universal. Neste momento, cada um deve olhar para si mesmo, para ver se é ou não o instrumento que Deus quer; isto é uma tarefa pessoalíssima, uma tarefa íntima e singular de cada um de vós com Deus.
Convencei-vos, meus filhos, de que o único caminho é o da santidade; no meio das nossas misérias – eu tenho muitas –, com toda a nossa alma, pedimos perdão. E, apesar dessas misérias, sois almas contemplativas. Eu entendo-o assim, não considero só os vossos defeitos, porque reagimos constantemente contra esse lastro, procurando o Senhor, nosso Deus, e sua bendita Mãe, procurando viver as normas que vos indiquei. Temos necessidade de nos dirigir a Deus e a Santa Maria – nossa Mãe –, para mantermos um trato constante com eles; não é isto que é próprio das almas contemplativas?
Quando acordei esta manhã, pensei que haveríes de querer que vos dissesse umas palavras e devo ter corado, porque me senti afogueado. Então, indo-me o coração para Deus, vendo que resta tanto por fazer, e pensando também em vós, convenci-me de que não dou tudo o que devo à Obra. Ele, sim; Deus, sim. Por isso, esta manhã viemos renovar a nossa ação de graças. Estou certo de que o vosso primeiro pensamento, no dia de hoje, foi também uma ação de graças.
O Senhor, sim, é fiel. E nós? Deveis responder pessoalmente, meus filhos. Como se vê cada um na sua vida? Não pergunto se vos vedes melhor ou pior, porque às vezes julgamos uma coisa e não somos objetivos. Às vezes, o Senhor permite que nos pareça que andamos para trás; então, apertamos-Lhe a mão com mais força, e enchemo- -nos de paz e alegria. Por isso, insisto, não vos pergun- to se ides melhor ou pior, mas se fazeis a vontade de Deus, se tendes desejos de lutar, de invocar a ajuda divina, de nunca empregar um meio humano sem empregar ao mesmo tempo os meios sobrenaturais.
Pensai se procurais dilatar o coração, se sois capazes de pedir ao Senhor – porque muitas vezes não somos capazes ou, se Lhe pedimos, pedimo-Lhe para que não no-lo conceda –, se sois capazes de pedir-Lhe, para que vo-lo conceda, serdes vós os últimos e os vossos irmãos os primeiros; serdes vós a luz que se consome, o sal que se gasta. É isto que temos de pedir: que saibamos incomodar-nos, para que os outros sejam felizes. Este é o grande segredo da nossa vida, e a eficácia do nosso apostolado.
Santidade para santificar
Ontem à tarde, estava na sala dos mapas. Sem me aperceber, olhei para a porta e tropecei com um desses despertadores que estão espalhados por estas casas: «Elegit nos ante mundi constitutionem ut essemus sancti in conspectu eius»7. Fiquei comovido. Não temos outro remédio senão lutar por ser santos. Esta é a nossa finalidade, não temos outra: santidade, santidade, santidade. As obras apostólicas – que são muitas – não são fins, são meios, como a enxada é o instrumento com que o lavrador tira da terra o fruto que o alimenta. Meus filhos, é por isso que temos de procurar a santidade com todas as nossas forças: «Elegit nos... ut essemus sancti!». Peço perdão ao Senhor pelas minhas faltas de correspondência, e graça para corresponder a esta escolha. Se necessário, peço mais graça que a da providência ordinária; nisto, não me importo de me exceder.
Meus filhos, não quero alongar-me. Ajudai-me a encher-me de gratidão e de reconhecimento a Deus Pai, a Deus Filho, a Deus Espírito Santo. E à Mãe de Deus e nossa Mãe, que nos concedeu sorrisos maternais sempre que tivemos necessidade deles. Quando eu tinha vislumbres de que o Senhor queria alguma coisa e não sabia o que era, dizia, gritando, cantando – como podia! –, umas palavras que, com certeza, se não as pronunciastes com a boca, saboreaste-las com o coração: «Ignem veni mittere in terram et quid volo nisi ut accendatur?»8: vim trazer fogo à Terra, e que quero senão que arda? E a resposta: «Ecce ego quia vocasti me!»9: aqui estou, porque me chamaste. Voltamos a dizê-lo agora, todos, ao nosso Deus?
Somos uma pobre coisa, Senhor, mas amamos-Te muito, e desejamos amar-Te muito mais, porque somos teus filhos. Contamos com todo o teu poder e com toda a nossa miséria. Reconhecendo a nossa miséria, correremos, como os filhos pequenos, para os braços da nossa Mãe, para o regaço da Mãe de Deus, que é nossa Mãe, e para o coração de Cristo Jesus. Receberemos toda a fortaleza, todo o poder, toda a audácia, toda a generosidade, todo o amor que Deus Nosso Senhor reserva às suas criaturas fiéis. E estaremos seguros, seremos eficazes e alegres, e cumpriremos – com essa fortaleza divina – a santa vontade de Deus, com a ajuda de Santa Maria.
Modelo de alma sacerdotal
Quantas vezes me comovi lendo a oração que a Igreja propõe que os sacerdotes recitem antes da missa! «O felicem virum, beatum Ioseph, cui datum est Deum, quem multi reges voluerunt videre et non viderunt, audire et non audierunt...»7. Nunca tivestes uma certa inveja dos apóstolos e dos discípulos, que conviveram com Jesus Cristo tão de perto? E depois, não tivestes uma certa vergonha, porque talvez – e sem talvez: eu estou certo disso, dada a minha fraqueza – tivésseis sido dos que se escaparam, dos que fugiram velhacamente e não permaneceram junto de Jesus na cruz?
«Quem multi reges voluerunt videre et non viderunt, audire et non audierunt; non solum videre et audire, sed portare, deosculare, vestire et custodire»8. Não vo-lo posso ocultar: algumas vezes, quando estou sozinho e sinto as minhas misérias, pego uma imagem do Menino Jesus, e beijo-O e embalo-O... Não tenho vergonha de vo-lo dizer. Se tivéssemos Jesus nos braços, que faríamos? Algum de vós teve irmãos pequenos, bastante mais novos? Eu tive. E pegava- -lhe ao colo, e embalava-o. O que teria feito com Jesus! «Ora pro nobis, beate Ioseph». Claro que temos de dizer assim!: «ut digni efficiamur promissionibus Christi»9. São José, ensina-nos a amar o teu Filho, nosso Redentor, o Deus-Homem! Roga por nós, São José!
E continuamos a considerar, meus filhos, esta oração que a Igreja propõe aos sacerdotes antes de celebrarem o Santo Sacrifício.
«Deus, qui dedisti nobis regale sacerdotium...»10. O sacerdócio é real para todos os cristãos, especialmente para aqueles que Deus chamou à sua Obra: todos temos alma sacerdotal. «Præsta, quæsumus, ut, sicut beatus Ioseph unigenitum Filium tuum, natum ex Maria Virgine...»11. Vedes que homem de fé? Vedes como admirava a Esposa, como a julgava incapaz de qualquer mancha, e como recebeu as inspirações de Deus, a luz divina, naquela escuridão tremenda para um homem tão íntegro? Como obedece! «Toma o Menino e sua Mãe e foge para o Egito»12, ordena-lhe o mensageiro divino. E ele assim faz. Crê na obra do Espírito Santo! Crê naquele Jesus, que é o Redentor prometido pelos profetas, por quem todos os que pertenciam ao Povo de Deus tinham esperado durante gerações e gerações: os patriarcas, os reis...
«Ut, sicut beatus Ioseph unigenitum Filium tuum, natum ex Maria Virgine, suis manibus reverenter tractare meruit et portare...». Nós, meus filhos – todos, leigos e sacerdotes –, trazemos Deus – Jesus – dentro da alma, no centro de toda a nossa vida, com o Pai e com o Espírito Santo, conferindo valor sobrenatural a todas as nossas ações. Tocamo-lo com as mãos, tantas vezes!
«Suis manibus reverenter tractare meruit et portare...». Não o merecemos. Só pela sua misericórdia, só pela sua bondade, só pelo seu amor infinito é que O trazemos connosco e somos portadores de Cristo.
«Ita nos facias cum cordis munditia…». É assim, assim, quer Ele que sejamos: limpos de coração. «Et operis innocentia» – a inocência das obras é a retidão de intenção – «tuis sanctis altaribus deservire»13. Que O sirvamos não só no altar, mas no mundo inteiro, que é um altar para nós. Todas as obras dos homens se fazem como que num altar, e cada um de vós, nessa união de almas contemplativas que é o vosso dia, diz de algum modo a sua missa, que dura vinte e quatro horas, à espera da missa seguinte, que durará outras vinte e quatro horas, e assim até ao fim da nossa vida.
«Ut sacrosantum Filii tui corpus et sanguinem hodie digne sumamus, et in futuro sæculo præmium habere mereamur æternum»14. Meus filhos: ensinamentos de pai, os de José; ensinamentos maravilhosos. Talvez exclameis, como eu digo, com a minha triste experiência: não posso nada, não tenho nada, não sou nada. Mas sou filho de Deus e o Senhor anuncia-nos, pelo salmista, que nos cumulará de bênçãos amorosas: «Prævenisti eum in benedictionibus dulcedinis»15, que de antemão nos prepara o caminho – o caminho geral da Obra e, dentro dele, o caminho próprio de cada um –, firmando-nos na via de Jesus, e de Maria, e de José.
Se fordes fiéis, meus filhos, poderão dizer de vós o que a liturgia afirma de São José, o Santo Patriarca: «Posuisti in capite eius coronam de lapide pretioso»16. Que tristeza sinto quando vejo as imagens dos santos sem auréola! Ofereceram-me – e fiquei comovido –duas pequenas imagens da minha amiga Santa Catarina, a da língua solta, a da ciência de Deus, a da sinceridade. E pedi imediatamente que lhes colocassem a auréola; uma coroa que não será de lapide pretioso, mas que terá boa aparência de ouro. Só aparência, como os homens.
Toda a vida ao serviço de Deus
Olhai: que faz José, com Maria e com Jesus, para seguir as indicações do Pai, as moções do Espírito Santo? Entrega-Lhe todo o seu ser, põe ao seu serviço a sua vida de trabalhador. José, que é uma criatura, alimenta o Criador; ele, que é um pobre artesão, santifica o seu trabalho profissional, coisa de que os cristãos se esqueceram durante séculos, e que o Opus Dei veio recordar. Dá a sua vida a Jesus, entrega-Lhe o amor do seu coração e a ternura dos seus cuidados, dá-Lhe a fortaleza dos seus braços, dá-Lhe tudo o que é e pode: o trabalho profissional quotidiano, próprio da sua condição.
«Beatus vir qui timet Dominum»17: bem-aventurado o homem que teme o Senhor, bem-aventurada a criatura que ama o Senhor e evita dar-Lhe desgostos. Isto é o timor Domini, o único temor que compreendo e sinto. «Beatus vir qui timet Dominum; in mandatis eius cupit nimis»18: bem-aventurada a alma que tem ambição, desejos de cumprir os preceitos divinos. Esta inquietação persiste sempre. Se alguma vez surge uma hesitação, porque o entendimento não vê com clareza, ou porque as nossas paixões se levantam como víboras, é altura de dizer: meu Deus, desejo servir-Te, quero servir-Te, tenho fome de Te amar com toda a pureza do meu coração!
O que nos falta então? Nada! «Gloria et divitiæ erunt in domo eius»19. Não procuramos a glória terrena, só a glória do Céu. Todos os meios – que é isso que são as riquezas da Terra – devem servir-nos para nos tornarmos santos, e para santificarmos o trabalho, e para santificarmos os outros com o trabalho. E no nosso coração haverá sempre uma grande serenidade. «Et iustitia eius»: a justiça de Deus, a lógica de Deus, «manet in sæculum sæculi»20: permanecerá pelos séculos dos séculos, se não a expulsarmos da nossa vida pelo pecado. Essa justiça de Deus, essa santidade que Ele pôs na nossa alma, exige – sempre com alegria e com paz – uma luta interior pessoal que não é de ruído, de alvoroço; é algo mais intenso, como que muito nosso, que não se perde a não ser que nos quebremos, a não ser que o quebremos como se fosse um cântaro de barro. Para o consertar, contamos com as normas, a confissão e a conversa fraterna com o diretor. E de novo a paz, a alegria! E voltamos a sentir mais desejos de cumprir os mandamentos do Senhor, mais ambição boa de servir a Deus e, por Ele, a todas as criaturas!
Desagravar o Senhor
Pedi perdão, meus filhos, pela confusão, pelas infâmias que se facilitam dentro da Igreja e que vêm de cima, corrompendo as almas quase desde a infância. Se não for assim, se não andarmos por este caminho de penitência e de reparação, não conseguiremos nada.
Somos poucos para tão grande multidão? Estamos cheios de misérias e fraquezas? Não podemos nada humanamente? Meditai comigo aquelas palavras de São Paulo: «Deus escolheu os néscios segundo o mundo para confundir os sábios; e Deus escolheu os fracos do mundo para confundir os fortes; e as coisas vis e desprezíveis do mundo, e aquelas que não eram nada, para destruir as que parecem grandes, a fim de que nenhum mortal se vanglorie perante Ele»3.
Apesar das nossas misérias e dos nossos erros, o Senhor escolheu-nos para sermos seus instrumentos, nestes momentos difíceis da história da Igreja. Meus filhos, não podemos escudar-nos por trás da nossa pequenez pessoal, não devemos enterrar os talentos que recebemos4, não podemos olhar com indiferença as ofensas que se fazem a Deus e o mal que se ocasiona às almas. «Estai alerta, não aconteça que, já avisados, sejais seduzidos pelos insensatos e venhais a perder a vossa firmeza»5.
Cada um no seu estado, e todos com a mesma vocação, respondemos afirmativamente ao chamamento divino, para servir Deus e a Igreja, e para salvar almas. Portanto, temos mais dever e mais direito que outros de estar alerta; temos mais responsabilidade de viver com fortaleza; e também temos mais graça.
Reparastes como são atuais as palavras da epístola do primeiro domingo da Quaresma? «Exortamo-vos a não receberdes em vão a graça de Deus, pois Ele mesmo diz: “No tempo oportuno Eu te ouvi, e no dia da salvação vim em teu auxílio”. É este o tempo favorável, é este o dia da salvação. Não demos a ninguém motivo de escândalo, para que o nosso ministério não seja vituperado; mas comportemo-nos em todas as coisas como devem comportar-se os ministros de Deus»6.
Humildade agradecida
Espero que, neste Natal, todas as minhas filhas e os meus filhos se firmem na decisão de ser mais humildes. Eu conheço-vos, e parece-me notar já a vossa alegria ao admitir sinceramente que não conseguistes os frutos que deveríeis render. Porque assim decidireis aproximar-vos, envergonhados de verdade, da gruta de Belém, e pedireis perdão ao Menino por vós e por mim, e por tantas pessoas que são como a figueira estéril, carregadas de folhas, de aparência. E, se o Senhor vos permitir ver que deseja servir-Se de vós, que já está a servir-Se há vários anos, ou mesmo há muito tempo, então, «in gratiarum semper actione maneamus»! Rompei em ações de graças a Deus Nosso Senhor, porque vos escolheu como instrumentos. Mas dai-Lhe graças sinceramente, porque senão sereis uma árvore frondosa, a abarrotar de folhas e talvez de frutos, mas de frutos vãos, vazios, sem peso, porque não vergam os ramos. Os frutos maduros, transbordantes de polpa carnuda, doce e grata ao paladar, conseguem abaixar os ramos da árvore com humildade.
Aproximemo-nos de Belém e do sacrário com ações de graças e o propósito de sermos mais humildes. Jesus espera-nos. Dizei-Lhe palavras de afeto. Contai-Lhe as vossas fraquezas – eu conto-Lhe as minhas – e, sem cacarejar, reconheçamos algumas vezes que sim, que levámos a cabo este trabalho e aquele, que nos esforçámos com muita alegria e com a sua graça, que Ele nos manda através das mãos de sua Santíssima Mãe, que também é nossa Mãe, porque sem a sua ajuda não fazemos nada.
Esta é a disposição mínima de quem trabalha com almas: o instrumento nunca fica com os frutos. Se há algo saboroso na nossa vida, se há algo que agrada ao Senhor, se há algo que consegue que outras almas se salvem e que nós percorramos um caminho de amor, devemo-lo a Deus, a este Senhor que quis fazer-Se Menino.
Mais umas palavras, para terminar: continuai a rezar muito pela Igreja! Amai a Igreja e o Papa com toda a alma. Uni-vos cada vez mais fortemente às intenções da minha missa, para que todos, em união com Maria, sob o patrocínio de São José, vivamos numa contínua ação de graças à Santíssima Trindade, Pai, Filho e Espírito Santo.
Pela mão de Deus
O Senhor fez-me ver que me levou sempre pela mão. Eu tinha catorze ou quinze anos quando comecei a pressentir o amor, a perceber que o coração me pedia algo grande e que fosse amor. Vi com clareza que Deus queria alguma coisa, mas não sabia o que era. Por isso, falei com o meu pai e disse-lhe que queria ser sacerdote. Ele não esperava essa saída. Foi a única vez – já vo-lo contei noutras ocasiões – em que vi lágrimas nos seus olhos. Respondeu- -me: olha, meu filho, se não for para seres um sacerdote santo, porque queres sê-lo? Mas não me oporei ao que desejas. E levou-me a falar com um amigo seu, para que me orientasse.
Eu não sabia o que Deus queria de mim, mas era – evidentemente – uma escolha. Algum dia havia de vir o que fosse... Enretanto, percebia que não servia, e proferia essa ladainha que não é de falsa humildade, mas de conhecimento próprio: não valho nada, não tenho nada, não posso nada, não sou nada, não sei nada... Escrevi-vos isto muitas vezes! Tendes impressas muitas coisas destas.
Na oração, o Paco Vives lia um desses volumes de meditações que utilizamos habitualmente e que, com uma pequena correção de estilo, são maravilhosos. E dei graças a Deus porque temos esse instrumento, e fui vendo muitas coisas. Vi o caminho que percorremos, a maneira como o percorremos, e fiquei pasmado. Porque, efetivamente, mais uma vez se cumpriu o que diz a Escritura: o que é néscio, o que não vale nada, o que – pode dizer-se assim – nem sequer existe..., o Senhor pega em tudo isso e coloca-o ao seu serviço. E foi assim que pegou naquela criatura como instrumento seu. Não tenho motivo algum de soberba.
Deus fez-me passar por muitas humilhações, por aquilo que me parecia uma vergonha, e que agora vejo que eram as virtudes dos meus pais. Digo-o com alegria. O Senhor tinha de me preparar; e, como o que estava ao meu redor era o que mais me doía, batia nisso. Foram humilhações de todo o tipo, mas enfrentadas com fidalguia cristã; vejo-o agora, e cada dia com mais clareza, com mais agradecimento ao Senhor, aos meus pais, à minha irmã Carmen... Já vos contei a história do meu irmão Santiago, que também está relacionada com a Obra. Perdoai-me se vos falo disto.
Missal Romano, I Domingo do Advento, leitura (Rom 13, 11):
«Irmãos, sabeis que são horas de acordar do sono».
Ibid. (Rom 13, 12): «A noite vai passando e aproxima-se o dia; rejeitemos, pois, as obras das trevas, e revistamo-nos das armas da luz».
Ibid. (Rom 13, 13): «Como quem anda de dia, andemos decentemente».
Missal Romano, I Domingo do Advento, antífona da comunhão (Sl 84, 13): «O Senhor nos dará a sua bênção e a nossa terra dará muito fruto».
Prov 8, 31.
Sl 49, 10-12.
Jo 6, 8-9.
Jo 6, 10.
Jo 6, 7.
Jo 6, 10.
Ef 1, 4: «Escolheu-nos antes da criação do mundo para sermos santos, na sua presença».
Lc 12, 49.
1Sam 3, 8.
Missal Romano, Preparação para a missa, Oração a São José: «ó feliz varão, bem-aventurado José, a quem foi dado ver a Deus, que muitos reis quiseram ver e não viram, e ouvir e não ouviram…».
Ibid.: «Que muitos reis quiseram ver e não viram, e ouvir e não ouviram; e não só vê-lo e ouvi-lo, mas abraçá-lo, beijá-lo, vesti-lo e guardá-lo».
Ibid.: «Rogai por nós, bem-aventurado São José, para que sejamos dignos de alcançar as promessas de Cristo».
Ibid.: «ó Deus, que nos concedestes o sacerdócio real».
Ibid.: «Fazei, nós Vos pedimos, que, assim como o bem-aventurado José mereceu tratar reverentemente e cuidar com as suas mãos do teu Filho unigénito, nascido de Maria Virgem…» (traduz-se já a continuação da oração).
Mt 2, 13.
Missal Romano, Preparação para a missa, Oração a São José: «Também nós sirvamos nos vossos santos altares de coração limpo e com boas obras».
Ibid.: «De modo que hoje recebamos dignamente o sacrossanto corpo e sangue do vosso Filho e, na vida futura, mereçamos alcançar o prémio eterno».
Sl 20, 4: «Preparaste-o, Senhor, com bênçãos de doçura».
Ibid.: «Colocaste sobre a sua cabeça uma coroa de pedras preciosas».
Sl 111, 1.
Ibid.
Ibid.: «Glória e riquezas enchem a sua casa».
Ibid.
Documento impresso de https://escriva.org/pt-br/book-subject/en-dialogo-con-el-se%C3%B1or/28553/ (17/11/2025)