Tempo de ação de graças
Introdução
«Nasceu-vos hoje na cidade de David o Salvador, 100 que é Cristo, o Senhor»1. Minhas filhas e meus filhos, nesta festa de Natal, pusemo-nos de novo diante de Jesus Menino, animados por Maria, sua Mãe e Mãe nossa, e na companhia do glorioso São José, a quem tanto amo. Se consideramos os séculos que passaram desde que Ele quis tomar a nossa carne, temos de nos encher de vergonha porque são muitos os que ainda não conhecem a Cristo e até desprezam os seus preceitos. E isto não acontece só em terras distantes, mas nas poucas nações que se chamam cristãs, e na própria Igreja de Cristo, católica e romana.
Mas o Natal não é um dia de tristeza. «Não temais», disse o anjo aos pastores, «porque vos anuncio uma grande alegria para todo o povo»2. Estas maravilhosas festas do Senhor e da nossa Mãe Santa Maria, sempre virgem, constituem para nós uma alegria muito grande. Deveriam sê-lo para todos os cristãos, mas nos últimos tempos, infelizmente, há muitos sítios em que parecem festas pagãs. É o resultado da propaganda de massas destinada a descristianizar a sociedade. Temos de fomentar a paciência, filhos, para não perder a paz; e, ao mesmo tempo, a impaciência de pedir ao Senhor que solucione todos estes males. Por isso, começaremos e acabaremos a nossa oração como sempre: com mais serenidade, com mais otimismo, com um sorriso novo nos lábios, com uma alegria renovada no coração e com um propósito firme de ser cada dia mais santos.
Criados para a eternidade
Contudo, filhas e filhos meus, dói-nos muito ver que se promovem, dentro da própria Igreja, campanhas tremendas contra a justiça, que contribuem necessariamente para a falta de paz na sociedade, porque não há paz nas consciências. Enganam-se as almas: fala-se-lhes de uma libertação que não é a de Cristo; ignoram-se os ensinamentos de Jesus, o seu Sermão da Montanha, essas bem-aventuranças que são um poema do amor divino; busca-se uma felicidade apenas terrena, que não é possível alcançar neste mundo.
Meus filhos, a alma foi criada para a eternidade. Aqui, estamos apenas de passagem. Não alimenteis ilusões: a dor será uma companheira inseparável da viagem. Quem se empenha exclusivamente em não sofrer, fracassará; e talvez não obtenha outro resultado senão tornar mais aguda a amargura própria e a alheia. Ninguém gosta de que os outros sofram, e é um dever de caridade esforçar-se o mais possível por aliviar os males do próximo.
O cristão, porém, tem de ter o atrevimento de afirmar que a dor é uma fonte de bênçãos, de bem, de fortaleza; que é uma prova do amor de Deus; que é um fogo que nos purifica e prepara para a felicidade eterna. Não foi esse o sinal que o anjo nos indicou para encontrarmos Jesus? «Isto vos servirá de sinal: encontrareis um Menino envolto em panos e deitado numa manjedoura»3.
Quando se aceita o sofrimento como o Senhor o aceitou em Belém e na cruz, e se compreende que é uma manifestação da bondade de Deus, da sua vontade salvífica e soberana, então ele nem sequer é uma cruz; quando muito, é a cruz de Cristo, que não é pesada, porque é Ele próprio que a carrega. «Quem não toma a sua cruz para Me seguir não é digno de Mim»4. Hoje, porém, essas palavras foram esquecidas, e há «muitos neste mundo, como vos disse muitas vezes – e repito-o agora com lágrimas –, que procedem como inimigos da cruz de Cristo»5, organizando campanhas horrendas contra a sua pessoa, a sua doutrina e os seus sacramentos. Há muitos que desejam mudar a razão de ser da Igreja, reduzindo-a a uma instituição de fins temporais, antropocêntrica, com o homem como soberbo pináculo de todas as coisas.
O Natal recorda-nos que o Senhor é o princípio, o fim e o centro da criação: «No princípio era o Verbo, e o Verbo estava em Deus, e o Verbo era Deus»6. É Cristo, minhas filhas e meus filhos, que atrai a Si todas as criaturas: «Por Ele foram criadas todas as coisas, e sem Ele não foi feita coisa alguma de todas quantas foram feitas»7. E, ao encarnar, vindo viver entre nós8, demonstrou-nos que não estamos nesta vida para procurar uma felicidade temporal e passageira, mas para alcançar a bem-aventurança eterna, seguindo os seus passos. E só chegaremos lá aprendendo dele.
A Igreja foi sempre teocêntrica. A sua missão é conseguir que todas as coisas criadas tendam para Deus como fim, por meio de Jesus Cristo, «cabeça do corpo da Igreja [...], para que em tudo tenha Ele a primazia; pois aprouve ao Pai fazer habitar nele a plenitude de todos os seres, e por Ele reconciliar todas as coisas consigo, restabelecendo a paz entre o Céu e a Terra por meio do sangue que Ele derramou na cruz»9. Entronizemo-lo, pois, não só no nosso coração e nas nossas ações, mas também – com o desejo e com o trabalho apostólico – no cume de todas as atividades dos homens.
Deus e Homem verdadeiro
Não vos comove contemplar Jesus Cristo recém-nascido, inerme, necessitado da nossa proteção e ajuda? Não vedes que implora que O amemos? Estes pensamentos não são ilusões tolas, mas uma prova de que amamos a Jesus com todo o coração, e de que Lhe agradecemos que tenha decidido tomar a nossa carne, assumi-la. Deus não Se vestiu de homem; Deus encarnou: «perfectus Deus, perfectus Homo»!10
Há muitos anos, mandei colocar na cabeceira da minha cama uns azulejos com a legenda «Iesus Christus, Deus Homo»: Jesus Cristo, Deus e Homem. Porque me comove saber que Ele tem um corpo, agora glorioso, mas que é de carne como a nossa. Que o Senhor padeceu todas as misérias e dores humanas, menos o pecado11. Que passou fome e sentiu sede; que conheceu o calor, como naquele dia junto ao poço de Sicar, e que teve frio nesta noite de Belém. Tudo isso nos enamora, a vós e a mim, levando- -nos a deixar todas as coisas: «relictis omnibus»12, como os apóstolos, e a fazê-lo «festinantes»13 – pressurosos –, como os pastores. Temos de empreender o caminho, minhas filhas e meus filhos, e de imitar este Jesus nosso que Se entregou e continua a entregar-Se quotidianamente no altar, perpetuando o sacrifício divino do Calvário.
Jesus Cristo, «como permanece eternamente, possui o sacerdócio eterno»14. A sua mediação sacerdotal atualiza-se por meio dos sacerdotes, que somos ipse Christus no altar. Ao celebrar a Santa Missa, eu não presido a uma assembleia, mas renovo o sacrifício da cruz in persona Christi15.
O que podemos aprender de Jesus Cristo no presépio de Belém, onde nasceu desamparado? O que podemos considerar nesse outro presépio que é o tabernáculo, onde Ele nos espera, ainda mais indefeso? Não vos dói que
O coloquem a um canto, que – também fisicamente – Lhe virem as costas, O desprezem e O maltratem? Minhas filhas e meus filhos, repetir-vos-ei o que já vos recordei noutras ocasiões, o que os cristãos viveram durante muitos séculos: Jesus Cristo, Senhor Nosso, quis contar convosco e comigo para corredimir; quer servir-Se da vossa inteligência e do vosso coração, da vossa palavra e dos vossos braços. Cristo inerme traz-nos à memória que a Redenção também depende de nós.
Uma humildade sem caricaturas
«Vamos até Belém ver o que lá aconteceu e o que o Senhor nos manifestou»16. Chegámos, filhos, em bom momento, porque esta é uma noite muito má para as almas. Uma noite na qual as grandes luminárias, que deviam irradiar luz, difundem trevas; em que os que deviam ser sal para impedir a corrupção do mundo estão insípidos e, por vezes, publicamente podres.
Não é possível deixar de sofrer ao considerar estas calamidades. Estou certo, porém, filhas e filhos de minha alma, de que, com a ajuda de Deus, saberemos tirar delas abundante proveito e paz fecunda. Porque insistiremos na oração e na penitência. Porque crescerá em nós a certeza de que tudo se resolverá. Porque alimentaremos o propósito de corresponder fielmente, com a docilidade dos bons instrumentos. Porque aprenderemos, neste Natal, a não nos afastarmos do caminho que o Senhor nos indica em Belém: o caminho da humildade verdadeira, sem caricaturas. Ser humilde não é andar sujo nem desleixado, nem ser indiferente ao que acontece à nossa volta, num contínuo abandono de direitos. Muito menos é apregoar coisas tolas contra si mesmo. Onde há comédia e hipocrisia não pode haver humildade, porque a humildade é a verdade.
Sem o nosso consentimento, sem a nossa vontade, Deus Nosso Senhor não poderá santificar-nos nem salvar- -nos, apesar da sua bondade sem limites. Mais ainda: sem Ele, não faremos nada de proveito. Da mesma forma que se diz que um campo produziu isto, e que aquelas terras produziram aquilo, também se pode afirmar de uma alma que é santa, e de outra que realizou umas quantas obras boas. Mas, na verdade, ninguém é bom senão Deus17; é Ele que torna fértil o campo, que dá à semente a possibilidade de se multiplicar, que confere a uma estaca que parece seca o poder de lançar raízes. Foi Ele que abençoou a natureza humana com a sua graça, permitindo-lhe comportar-se cristãmente, viver de modo a sermos felizes, lutando na expectativa da vida futura, que é a felicidade e o amor para sempre. Humildade, filhos, é saber que «nem o que planta é alguma coisa, nem o que rega, mas só Deus, que é quem dá o incremento»18.
Que nos ensina o Senhor de todas as coisas, o Dono do Universo? Nestes dias de Natal, as canções natalícias de todos os países, tenham ou não muita tradição cristã, cantam ao Rei dos reis que chegou. E que manifestações tem a sua realeza? Uma manjedoura! Não tem sequer os detalhes com que rodeamos Jesus Menino de amor nos nossos oratórios. Em Belém, o nosso Criador não tem nada, tanta é a sua humildade!
Assim como os alimentos são condimentados com sal para não ficarem insípidos, assim também temos de pôr sempre humildade na nossa vida. Filhas e filhos meus – a comparação não é minha, é usada pelos autores espirituais há mais de quatro séculos –, não façais como as galinhas que, mal põem um ovo, atroam os ares com os seus cacarejos. É preciso trabalhar, é preciso fazer o trabalho, intelectual ou manual, mas sempre apostólico, com grandes intenções e grandes desejos – que o Senhor transforma em realidades – de servir Deus e passar desapercebido.
Filhos, assim vamos aprendendo de Jesus, nosso Mestre, a contemplá-lo recém-nascido nos braços de sua Mãe, sob o olhar protetor de José, um homem tão de Deus que foi escolhido pelo Senhor para Lhe fazer as vezes de pai na Terra. Ele defende a vida do recém-nascido com o seu olhar, com o seu trabalho, com os seus braços, com o seu esforço, com os seus meios humanos.
Vós e eu – nestes momentos em que crucificam Jesus Cristo de novo tantas vezes, nestas circunstâncias em que parece que os povos da antiga cristandade estão a perder a fé, desde o vértice até a base, como dizem alguns –, vós e eu devemos empenhar-nos muito em nos parecermos com José, na sua humildade e também na sua eficácia. Não vos enche de alegria pensar que podemos como que proteger Nosso Senhor, o nosso Deus?
Sempre em ação de graças
Estou certo de que o Espírito Santo vos concederá algumas vezes, como penhor do prémio que vos reserva pela vossa lealdade, a graça de ver que estais a dar bom fruto. Nessas ocasiões, dizei: Senhor, sim, é verdade, Tu conseguiste que, apesar das minhas misérias, o fruto tivesse crescido no meio de tanto deserto. Obrigado, Deo gratias!
Noutros momentos, porém, talvez o demónio – que nunca faz férias – vos tente, levando-vos a atribuir-vos méritos que não são vossos. Quando perceberdes que os pensamentos e os desejos, as palavras, as ações e o trabalho se enchem de uma complacência vã, de um orgulho néscio, respondei ao demónio: sim, tenho fruto, Deo gratias!
Por isso, este ano é especialmente um tempo de ação de graças, como indiquei às minhas filhas e aos meus filhos com umas palavras tomadas da liturgia: «Ut in gratiarum semper actione maneamus»19: que estejamos sempre numa contínua ação de graças a Deus por tudo, pelo que parece bom e pelo que parece mau, pelo que é doce e pelo que é amargo, pelo branco e pelo negro, pelo pequeno e pelo grande, pelo pouco e pelo muito, pelo que é temporal e pelo que tem alcance eterno. Demos graças a Nosso Senhor por tudo o que se passou neste ano, incluindo, de certo modo, as nossas infidelidades, porque as reconhecemos e nos levaram a pedir perdão, e a concretizar o propósito – que fará muito bem às nossas almas – de nunca mais sermos infiéis.
Não devemos albergar outro desejo senão o de estarmos pendentes de Deus, em constante louvor e glória ao seu nome, ajudando-O no seu divino labor de Redenção. Então, o nosso afã será dar a conhecer Jesus Cristo e, por Ele, o Pai e o Espírito Santo; sabendo que chegamos até Jesus por meio de Maria e do trato com São José e com os nossos santos anjos da guarda.
Como vos escrevi há muitos anos, até os frutos maus, os ramos secos, as folhas caídas, quando se enterram ao pé do tronco, podem revigorar a árvore da qual se desprenderam. Porque foi que os nossos erros e equívocos, numa palavra, os nossos pecados – que não desejamos, que abominamos –, nos fizeram bem? Porque a seguir veio a contrição, enchemo-nos de vergonha e de desejos de ser melhores, colaborando com a graça do Senhor. Pela humildade, o que era morte converte-se em vida; o que ia produzir esterilidade e fracasso torna-se triunfo e abundância de frutos.
Todos os dias, no ofertório da missa, quando ofereço a hóstia santa, ponho na patena todas as minhas filhas e os meus filhos que estão doentes ou atribulados. Incluo as falsas preocupações, as que por vezes procurais porque vos dá na veneta; para que pelo menos o Senhor vos tire da cabeça essas tolices.
«Quando os anjos voltaram para o Céu, os pastores [...] foram a toda a pressa e encontraram Maria, José e o Menino reclinado na manjedoura»20. Quando nos aproximamos do Filho de Deus, convencemo-nos de que somos uns pigmeus ao lado de um gigante. Sentimo-nos pequeníssimos, humilhados, e ao mesmo tempo repletos de amor a Deus Nosso Senhor, que, sendo tão grande, tão imenso e infinito, fez de nós seus filhos. E sentimo- -nos impelidos a dar-Lhe graças, este ano, durante a vida inteira e pela eternidade. Que bem soam as estrofes do prefácio em canto gregoriano: «Vere dignum et iustum est, æquum et salutare, nos tibi semper, et ubique gratias agere»21! Nós somos pequenos, pequenos; e Ele é o nosso Pai omnipotente e eterno.
Os frutos da humildade
Não vos esqueçais, filhas e filhos meus, de que a humildade é uma virtude tão importante que, se ela faltasse, não haveria mais nenhuma. Na vida interior – torno a dizer-vos –, é como o sal, que condimenta todos os alimentos. Porque, mesmo que um ato pareça virtuoso, não o será se for consequência da soberba, da vaidade, da tolice; se o fizermos pensando em nós, antepondo-nos ao serviço de Deus, ao bem das almas, à glória do Pai, do Filho e do Espírito Santo.
Quando a atenção se centra no nosso eu, quando nos entretemos a pensar se nos vão louvar ou se nos vão criticar, causamos um mal muito grande a nós próprios. Só Deus deve interessar-nos; e, por Ele, todos os que pertencemos ao Opus Dei, e todas as almas do mun- do, sem exceção. De modo que... fora com o eu, que é um estorvo!
Se agirdes assim, filhas e filhos, quantos inconvenientes desaparecerão, quantos maus bocados evitaremos! Se alguma vez passais um mau bocado, e percebeis que a alma se vos enche de inquietação, é porque estais preocupados convosco próprios. O Senhor veio redimir, veio salvar, e só Se preocupou com isso. E nós havemos de estar preocupados em fomentar a soberba?
Se tu, meu filho, te centras em ti, não só tomas um mau caminho, mas perdes a felicidade cristã nesta vida, esse júbilo e essa alegria que não são completos, porque a felicidade só será plena no Céu.
Li num velho livro espiritual que as árvores de ramos muito altos e eretos são infrutíferas. Pelo contrário, aquelas que têm ramos baixos, caídos, estão cheias de frutos maciços, de polpa saborosa; e, quanto mais perto do chão, mais abundante é o fruto. Filhos, pedi a humildade, que é uma virtude tão valiosa. Porque somos tolos? Sempre convencidos de que as nossas coisas são melhores, sempre seguros de que temos razão. Assim como a água embebe o torrão de açúcar, assim se metem na alma a vaidade e o orgulho. Se quereis ser felizes, sede humildes; rejeitai as insinuações mentirosas do demónio, quando vos sugerir que sois admiráveis. Vós e eu já compreendemos que, infelizmente, somos muito pouca coisa; mas, quando contamos com Deus Nosso Senhor, outro galo canta. Devemos-Lhe tudo. Renovemos, pois, o nosso agradecimento: «ut in gratiarum semper actione maneamus»!
A ação de graças, filhas e filhos meus, nasce de um orgulho santo, que não destrói a humildade nem enche a alma de soberba, porque se baseia unicamente no poder de Deus, e é feito de amor, de segurança na luta. Agora que começa o ano, e se renovam os propósitos de caminhar «in novitate vitæ»: com uma vida nova, podemos já dar graças ao Senhor por tudo o que virá; por tudo e especialmente por aquilo que continuará a fazer-nos sofrer.
Como se trabalha a pedra que se vai colocar na fachada de um edifício, a coroar o arco? Necessita de um tratamento diferente da que vai ser colocada nos alicerces. Tem de ser bem lavrada, com muitos golpes de cinzel, até ficar primorosamente acabada. Portanto, meus filhos, devemos agradecer ao Senhor todas as contrariedades pessoais, todas as humilhações, tudo aquilo que as pessoas consideram mau e que não é verdade que o seja. Para um filho de Deus, será uma prova do amor divino, que talvez queira pôr-nos bem à vista, e por isso nos esculpe com golpes seguros e certeiros. Nós temos de colaborar com Ele, pelo menos não opondo resistência, deixando-O trabalhar.
Daqui se deduz que a maior parte do nosso trabalho espiritual é rebaixar o nosso eu, para que o Senhor acrescente o que desejar com a sua graça. Enquanto durar o tempo da nossa vida, muito ou pouco, não nos queixaremos do nosso Pai Deus, mesmo que nos sintamos como que à beira de um abismo de imundice, ou de vaidade, ou de estultícia. É por isso que insisto tanto na humildade pessoal. Porque é uma bela virtude para as filhas e os filhos de Deus no Opus Dei.
Quem é humilde não sabe que é, e julga-se soberbo. E quem é soberbo, vaidoso, néscio, considera-se excelente. Terá pouco conserto, enquanto não se desmoronar e se vir no chão, e mesmo assim poderá continuar a dar-se ares de grandeza. Também por isso, precisamos da direção espiritual. Quem nos vê de longe, contempla bem o que somos; quando muito, pedras para utilizar em baixo, nos alicerces, e não a que será colocada na chave do arco.
Humildade agradecida
Espero que, neste Natal, todas as minhas filhas e os meus filhos se firmem na decisão de ser mais humildes. Eu conheço-vos, e parece-me notar já a vossa alegria ao admitir sinceramente que não conseguistes os frutos que deveríeis render. Porque assim decidireis aproximar-vos, envergonhados de verdade, da gruta de Belém, e pedireis perdão ao Menino por vós e por mim, e por tantas pessoas que são como a figueira estéril, carregadas de folhas, de aparência. E, se o Senhor vos permitir ver que deseja servir-Se de vós, que já está a servir-Se há vários anos, ou mesmo há muito tempo, então, «in gratiarum semper actione maneamus»! Rompei em ações de graças a Deus Nosso Senhor, porque vos escolheu como instrumentos. Mas dai-Lhe graças sinceramente, porque senão sereis uma árvore frondosa, a abarrotar de folhas e talvez de frutos, mas de frutos vãos, vazios, sem peso, porque não vergam os ramos. Os frutos maduros, transbordantes de polpa carnuda, doce e grata ao paladar, conseguem abaixar os ramos da árvore com humildade.
Aproximemo-nos de Belém e do sacrário com ações de graças e o propósito de sermos mais humildes. Jesus espera-nos. Dizei-Lhe palavras de afeto. Contai-Lhe as vossas fraquezas – eu conto-Lhe as minhas – e, sem cacarejar, reconheçamos algumas vezes que sim, que levámos a cabo este trabalho e aquele, que nos esforçámos com muita alegria e com a sua graça, que Ele nos manda através das mãos de sua Santíssima Mãe, que também é nossa Mãe, porque sem a sua ajuda não fazemos nada.
Esta é a disposição mínima de quem trabalha com almas: o instrumento nunca fica com os frutos. Se há algo saboroso na nossa vida, se há algo que agrada ao Senhor, se há algo que consegue que outras almas se salvem e que nós percorramos um caminho de amor, devemo-lo a Deus, a este Senhor que quis fazer-Se Menino.
Mais umas palavras, para terminar: continuai a rezar muito pela Igreja! Amai a Igreja e o Papa com toda a alma. Uni-vos cada vez mais fortemente às intenções da minha missa, para que todos, em união com Maria, sob o patrocínio de São José, vivamos numa contínua ação de graças à Santíssima Trindade, Pai, Filho e Espírito Santo.
Lc 2, 12.
Mt 10, 38.
Fil 3, 18.
Jo 1, 1.
Jo 1, 3.
Cf. Jo 1, 14.
Col 1, 18-20.
Passagem do Símbolo Atanasiano: «perfeito Deus, perfeito Homem».
Cf. Heb 4, 15.
Lc 5, 11.
Lc 2, 16.
Heb 7, 24.
Na pessoa de Cristo.
Documento impresso de https://escriva.org/pt-br/en-dialogo-con-el-se%C3%B1or/tempo-de-acao-de-gracas/ (17/11/2025)