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40A nossa vida, portanto, é um compromisso divino – que eu desejo concretizar num simples contrato civil de trabalho: algum dia vo-lo explicarei – que nos ajuda a viver, não os votos dos religiosos, mas as virtudes cristãs: ficando livres do pecado e feitos servos de Deus, e assim daremos o fruto de santificação e, finalmente, conseguiremos a vida eterna41.
O cristão, que se sabe livre, perde com gosto a liberdade por amor a Jesus Cristo, a fim de ser servidor de seus irmãos, os homens. Nós estamos convictos de que o nosso compromisso de amor com Deus e de serviço à sua Igreja não é como uma peça de roupa, que se põe e se tira: porque abarca toda a nossa vida, e a nossa vontade – com a graça do Senhor – é a de que a abarque sempre. Não devemos aparecer diante dos homens como bichos exóticos, como um elefante branco ou uma criatura rara, repugnante ou maravilhosa, transportada dentro de uma jaula, despertando quem olha para ela sentimentos de curiosidade, de admiração ou de amargura.
Somos iguais aos nossos concidadãos; por isso, devemos viver sempre na rua, sair para a rua ou, pelo menos, assomar-nos à janela. Temos o dever de diluir-nos, de dissolver-nos na multidão como sal de Cristo no condimento da sociedade. Assim, sem distinção de qualquer classe – porque o nosso espírito peculiar não o permite –, idênticos também nos afãs do mundo aos nossos parentes, aos nossos amigos, aos nossos colegas, faremos ver às gentes que elas não podem viver só do transitório, porque desse modo não serão felizes: faremos com que levantem o coração e a mente para o céu, e sentirão o gozo de saber que a criatura humana não é uma besta.
Devemos ser luz e fogo – aquele fogo que sempre arderá no altar42 – para levar os homens a Deus segundo as circunstâncias, respondendo ao chamado de Jesus Cristo: venite ad me omnes43, vinde todos a mim; ou para levar Deus aos homens, quando se escuta o Senhor que diz: ecce sto ad ostium et pulso44, olha que estou à porta e bato.
Mas o cristão verdadeiramente zeloso não há de esquecer que deve conservar-se no meio dessas duas atitudes com serenidade e com equilíbrio, pois, se o Senhor diz: ecce venio cito et merces mea mecum est45, eis que venho logo, trazendo comigo o prêmio para recompensar cada um segundo as suas obras, também diz por São Mateus que as almas têm de fazer-lhe força46.
Basta-nos recordar uma passagem maravilhosa ocorrida depois da Ressurreição: o Senhor se une no caminho àqueles discípulos que estão tristes e titubeantes na fé; e, quando abre para eles o sentido das Escrituras, chegados a Emaús, faz como que vai adiante. Cléofas e seu companheiro, com um modo de dizer que possui um não sei quê cheio de ternura divina e humana, lhe rogam: mane nobiscum, quoniam advesperascit, et inclinata est iam dies47; fica conosco, porque sem ti faz-se a noite para nós.
Documento impresso de https://escriva.org/pt-br/cartas-2/41/ (17/11/2025)