CARTA 6

[Sobre os traços característicos da chamada para o Opus Dei e da sua missão evangelizadora em serviço da Igreja; também designada pelo incipit latino Sincerus est. Tem a data de 11 de março de 1940 e foi enviada em 22 de novembro de 1966, embora haja notícias de sua impressão já em fevereiro de 1963.]

O espírito do Opus Dei é simples, cândido e genuíno. Fundamenta-se na Sagrada Escritura, inspirada por Deus, que é infinitamente simples e que diz de si próprio que é o Deus verdadeiro1, que é veraz2, que é a própria Verdade3.

Sobre esse espírito nosso, claro e leal, quero recordar-vos hoje alguns pontos, comentar-vos algumas das suas características. Porque o Senhor, filhas e filhos meus, ao acender em mim o vivo desejo de dirigir-me frequentemente a vós, faz-me compreender muito bem aquelas formosas palavras com as quais o Apóstolo Paulo falava aos gálatas: filioli mei, quos iterum parturio donec formetur Christus in vobis4; filhinhos meus, por quem padeço de novo até formar inteiramente a Cristo em vós.

Oxalá saibais meditar e viver fielmente tudo quanto vos escrevo, para que se possa dizer de vós o que também se disse dos primeiros cristãos: todos, efetivamente, aprenderam o que tinham de fazer; e não só aprenderam, mas puseram fervor em praticá-lo; e não só o praticaram nas cidades e no meio das praças, mas nos próprios cumes das montanhas5, em toda parte.

O espírito da Obra leva-nos a sentir muito profundamente a filiação divina: carissimi, nunc filii Dei sumus6; caríssimos, nós somos já agora filhos de Deus. Verdade gozosa que fundamenta toda a nossa vida espiritual, que enche de esperança a nossa luta interior e as nossas tarefas apostólicas; que nos ensina a conhecer, a tratar, a amar nosso Pai Deus com a confiada simplicidade de filhos. Mais ainda, precisamente porque somos filhos de Deus, esta realidade nos leva também a contemplar, com amor e admiração, todas as coisas que saíram das mãos de Deus Pai Criador.

O mundo, meus filhos, as criaturas todas do Senhor, são boas. Ensina a Sagrada Escritura que, concluída a obra maravilhosa da Criação, terminados o céu e a terra com o seu esplêndido séquito de seres7, viu Deus tudo quanto havia feito e viu que era tudo muito bom8.

Foi o pecado de Adão que rompeu essa divina harmonia da Criação. Mas Deus Pai, chegada a plenitude dos tempos, enviou ao mundo o seu Filho Unigênito para restabelecer esta paz: para que, redimindo o homem do pecado, adoptionem filiorum reciperemus9, fôssemos constituídos filhos de Deus, capazes de participar da intimidade divina; e para que, assim, fosse também possível para este homem novo, este novo ramo dos filhos de Deus10, libertar da desordem a criação inteira, restaurando todas as coisas em Cristo11, que as reconciliou com Deus12.

Para isso, meus filhos, fomos chamados; essa há de ser a nossa tarefa apostólica, que, com uma espiritualidade própria e uma ascética peculiar, enquadra-se maravilhosamente dentro da única missão de Cristo e da sua Igreja.

O Senhor nos chama para que o imitemos como filhos seus queridíssimos – estote ergo imitatores Dei, sicut filii carissimi13, sede imitadores de Deus, como filhos seus muito queridos –, colaborando humilde e fervorosamente no divino propósito de unir o que está quebrado, de salvar o que está perdido, de ordenar o que o homem desordenou, de levar ao seu fim o que se desencaminha: de restabelecer a divina concórdia de tudo o que foi criado.

Repito-vos com São João: videte qualem caritatem dedit nobis Pater, ut filii Dei nominemur et simus14. Chamamo-nos e somos filhos de Deus; irmãos, portanto, do Verbo feito carne15, de Jesus Cristo, dAquele de quem foi dito: in ipso vita erat, et ita erat lux hominum16, nEle estava a vida, e a vida era a luz dos homens.

Filhos da luz, irmãos da luz: isso somos. Portadores da única chama capaz de iluminar os caminhos terrenos das almas, do único fulgor onde nunca poderão dar-se escuridões, penumbras ou sombras17.

Et lux in tenebris lucet, et tenebrae eam non comprehenderunt18; e esta luz resplandece em meio às trevas, e as trevas não a receberam. O Senhor continua a derramar resplendores sobre os homens, uma luminosidade que é vida e calor de misericórdia, porque Ele é caridade, amor19; e serve-se de nós como tochas, para que essas luzes iluminem as almas e sejam para todos fonte de vida, depois de ter alumbrado e enchido a nossa com o fogo das ilustrações divinas20.

Filhas e filhos meus, de nós depende, em parte, que muitas almas não permaneçam nas trevas, mas caminhem por rumos que levam até a vida eterna. Por isso, contemplando esse panorama imenso que nos oferece a vocação com a qual o Senhor quis graciosamente honrar-nos, vem à minha memória aquelas palavras, também do Apóstolo João, que devemos repetir a tantos homens: o que vimos e ouvimos nós vos anunciamos, para que também vós tenhais comunhão conosco. Ora, a nossa comunhão é com o Pai e com o seu Filho Jesus Cristo. Escrevemo-vos estas coisas para que a vossa alegria seja completa21.

Convém que agradeçamos muito e com frequência esta chamada maravilhosa que recebemos de Deus, com uma gratidão real e profunda, estreitamente unida à humildade, que há de ser, na alma de cada um, a primeira consequência dessa luz comunicada pela infinita misericórdia do Senhor: quid autem habes quod no accepisti?22; que coisa tens tu que não tenhas recebido de Deus?

Mas não é só isso: si dixerimus quoniam peccatum non habemus, ipsi nos seducimus, et veritas in nobis non est23; se disséssemos que não temos pecado, nós mesmos estaríamos enganados, e não há verdade em nós. Pelo contrário, se formos humildes, se formos verazes, as misérias próprias da debilidade humana e as dificuldades que possam nos acontecer não serão nunca inconveniente para que a luz e o amor de Deus habitem em nós. Somente assim agiremos como fiéis filhos da luz, objeto da contínua misericórdia de Deus e instrumentos eficazes da sua vontade.

Essa humildade fomentará em nossa alma, e irradiará ao nosso redor, uma grande confiança: temos um intercessor junto ao Pai, Jesus Cristo, o Justo. Ele é a expiação pelos nossos pecados, e não somente pelos nossos, mas também pelos de todo o mundo24.

Humildade e confiança, meus filhos, para dirigir o olhar ao caminho que Deus nos assinalou, para compreendê-lo retamente, para segui-lo com lealdade. Uma fidelidade assim – rendida, entregue – dar-nos-á em todo momento a certeza de que verdadeiramente encontramos Jesus Cristo, de que com Ele estamos cumprindo a vontade do Pai, de que é verdadeira a nossa resposta filial à vocação recebida.

E ouvimos aquelas palavras de Paulo: que Cristo habite pela fé em vossos corações, arraigados e consolidados na caridade, a fim de que possais, com todos os cristãos, compreender qual seja a largura, o comprimento, a altura e a profundidade25 deste mistério: conheceremos, em todas as suas dimensões, o que é viver com Cristo.

Não esqueçais que a unidade de vida, a qual o chamamento à Obra de Deus pede, exige muito espírito de sacrifício e uma grande abnegação. Estamos num caminho divino, em que devemos seguir as pegadas de Jesus Cristo levando a nossa própria cruz, a Santa Cruz!: e espera Deus Nosso Senhor que nos esforcemos generosamente, que nos sintamos ditosíssimos ao cooperar com sacrifício para que a Obra se realize.

Deste modo, conseguiremos lavrar muitos campos de Deus que ainda não receberam a semente da salvação; venceremos muitas resistências dos que se opõem a Jesus Cristo e à sua Igreja – às vezes também, infelizmente, a resistência de alguns que dizem ser seus amigos –, que obstaculizam a liberdade dos filhos de Deus e a realização do seu Reino de caridade, de justiça e de paz; e vitalizaremos também, com o trabalho livre e responsável de cada um, nobres instituições humanas e os ambientes cristãos que agonizam.

Sim, meus filhos, asseguro-vos que contribuiremos poderosamente para iluminar o trabalho e a vida dos homens com o resplendor divino que o Senhor quis depositar em nossas almas. Mas não esqueçais que quem diz que mora em Jesus deve seguir o mesmo caminho que Ele seguiu26: caminho que conduz sempre à vitória, mas passando sempre, também, pelo sacrifício.

Não é meu propósito fazer nesta carta uma exposição detalhada das principais exigências da nossa vocação. No entanto, como deixei-me levar por São João para vos falar da necessidade do sacrifício no cumprimento da vontade do Pai, permiti-me que vos recorde agora a doutrina que o mesmo apóstolo dava aos primeiros cristãos, desejosos também de conhecer as obrigações da sua vocação cristã.

Trata-se de um ensinamento que possui toda a atualidade autêntica e perene do Evangelho, feita mais patente aos nossos olhos – por graça especial de Deus – em virtude da luz que põe na nossa alma o profundo sentimento da filiação divina: Caríssimos, não vos escrevo nenhum mandamento novo, e sim o mandamento antigo, que recebestes desde o princípio. Este mandamento antigo é a palavra que acabais de ouvir. Todavia, eu vos escrevo agora um mandamento novo – verdadeiramente novo, nele como em vós, porque as trevas passam e já resplandece a verdadeira luz. Aquele que diz estar na luz e odeia seu irmão jaz ainda nas trevas. Quem ama seu irmão permanece na luz e não se expõe a tropeçar. Mas quem odeia seu irmão está nas trevas e anda nas trevas, sem saber para onde dirige os passos; as trevas cegaram seus olhos27.

Caminho de amor é o nosso, meus filhos. De amor a Deus, nosso Pai; de sincera, constante e delicada caridade fraterna. Sempre e em tudo deveis viver a caridade, porque também continuamente a caridade do nosso Pai celestial é derramada nos nossos corações28. Unidos na caridade de Deus, consummati in unum29, vivendo o mandatum novum30 do Senhor, seremos luz e calor de Deus entre os homens e fortes como uma cidade amuralhada: frater qui adiuvatur a fratre quasi civitas firma31, o irmão ajudado pelo seu irmão é como uma cidade fortificada.

Não quero me deter em comentar-vos as maravilhas da caridade sobrenatural e do carinho humano verdadeiro que com tanta delicadeza estais praticando desde o começo da Obra: não são poucas as almas que descobriram o Evangelho neste calor cristão do nosso lar, onde ninguém pode sentir-se só, onde ninguém pode padecer a amargura da indiferença.

Mas não deixarei de vos fazer presente com insistência que essa caridade de Cristo, que nos urge – caritas enim Christi urget nos32 –, pede-nos um amor grande, sem limitações, com obras de serviço33 a todos os homens: de qualquer nação, língua, religião ou raça – sem fazer distinção, dentro da ordem da caridade, de objetivos pessoais, temporais ou de partido, pois os nossos fins são exclusivamente sobrenaturais –, porque por todos morreu Jesus Cristo, a fim de que todos possam chegar a ser filhos de Deus e irmãos nossos.

Assim faremos ver que a Santa Igreja – trabalhando nós e ensinando aos demais a trabalhar fraternalmente, lealmente, lado a lado com todos os homens – é uma realidade viva, que vive especialmente pelos seus santos, os quais nunca faltam em alguma parte deste Corpo Místico.

Amor sincero a todos os homens – manifestação necessária do amor que temos a Deus34 – e amor também ao mundo em que habitamos, a todas as coisas nobres da terra, que são também objeto do amor de Deus35. Esquecei, pois, a vossa pequenez e a vossa miséria, filhas e filhos meus, e colocai os olhos neste caudaloso rio de águas vivas que é a Obra, a qual tenciona contribuir eficazmente para que a humanidade se encha de caridade, de alegria e de paz.

Sendo a filiação divina – como antes vos recordava – o fundamento seguro da nossa vida espiritual, procurai meditar com frequência estas palavras de São Paulo: todos os que são conduzidos pelo Espírito de Deus são filhos de Deus. Porquanto não recebestes um espírito de escravidão para viverdes ainda no temor, mas recebestes o espírito de adoção pelo qual clamamos: Aba! Pai! O Espírito mesmo dá testemunho ao nosso espírito de que somos filhos de Deus. E, se filhos, também herdeiros, herdeiros de Deus e coerdeiros de Cristo, contanto que soframos com ele, para que também com ele sejamos glorificados36.

São palavras que resumem como deve ser o nosso trato com Deus Pai, em união com seu Filho e com o Espírito Santificador, diante da herança divina que nos espera se soubermos ser fiéis à tarefa apostólica que – pela nossa vocação – nos compete nesta terra.

Postula a me, et dabo tibi gentes hereditatem tuam, et possessionem tuam terminos terrae37; pede-me e te darei todas as nações em herança, e estenderei teus domínios até os confins da terra. Temos, por isso, o direito e o dever de levar a doutrina de Jesus Cristo a todas as ordens da vida humana, inserindo o espírito do Senhor em toda a parte, divinizando todas as tarefas do mundo.

Temos o direito e o dever de aproximar de Deus tudo quanto é criatura de Deus, obra da sua Criação, sem violentar nunca as exigências da ordem natural: porque – diz São Paulo – todas as coisas são vossas, quer Paulo, quer Apolo, quer Cefas, o mundo, a vida, a morte, o presente, o futuro: tudo é vosso, mas vós sois de Cristo, e Cristo é de Deus38.

Filhos da luz – dizíamos – para sermos luz do mundo. Vós sois a luz do mundo... Brilhe assim a vossa luz diante dos homens, de modo que vejam vossas boas obras e glorifiquem vosso Pai que está nos Céus39. Luz do mundo, meus filhos, vivendo com naturalidade na terra, que é o ambiente normal da nossa vida; participando em todas as tarefas, em todas as atividades nobres dos homens; trabalhando junto com eles na ocupação profissional de cada um; exercitando nossos direitos e cumprindo nossos deveres, que são os mesmos direitos e os mesmos deveres que têm os demais cidadãos – iguais a nós – da sociedade em que vivemos. Mas sempre livres de qualquer atadura que possa entorpecer o cumprimento amoroso da vontade de Deus.

Por isso, devemos buscar continuamente – no meio das nossas diárias ocupações seculares – o trato e a união constante com Jesus Cristo, de modo que esse fogo que o Senhor acendeu em nossas almas nunca se apague nem enfraqueça: porque deve ser verdade que aqueles que nos rodeiam notem que somos luz de Deus que ilumina o mundo.

40A nossa vida, portanto, é um compromisso divino – que eu desejo concretizar num simples contrato civil de trabalho: algum dia vo-lo explicarei – que nos ajuda a viver, não os votos dos religiosos, mas as virtudes cristãs: ficando livres do pecado e feitos servos de Deus, e assim daremos o fruto de santificação e, finalmente, conseguiremos a vida eterna41.

O cristão, que se sabe livre, perde com gosto a liberdade por amor a Jesus Cristo, a fim de ser servidor de seus irmãos, os homens. Nós estamos convictos de que o nosso compromisso de amor com Deus e de serviço à sua Igreja não é como uma peça de roupa, que se põe e se tira: porque abarca toda a nossa vida, e a nossa vontade – com a graça do Senhor – é a de que a abarque sempre. Não devemos aparecer diante dos homens como bichos exóticos, como um elefante branco ou uma criatura rara, repugnante ou maravilhosa, transportada dentro de uma jaula, despertando quem olha para ela sentimentos de curiosidade, de admiração ou de amargura.

Somos iguais aos nossos concidadãos; por isso, devemos viver sempre na rua, sair para a rua ou, pelo menos, assomar-nos à janela. Temos o dever de diluir-nos, de dissolver-nos na multidão como sal de Cristo no condimento da sociedade. Assim, sem distinção de qualquer classe – porque o nosso espírito peculiar não o permite –, idênticos também nos afãs do mundo aos nossos parentes, aos nossos amigos, aos nossos colegas, faremos ver às gentes que elas não podem viver só do transitório, porque desse modo não serão felizes: faremos com que levantem o coração e a mente para o céu, e sentirão o gozo de saber que a criatura humana não é uma besta.

Devemos ser luz e fogo – aquele fogo que sempre arderá no altar42 – para levar os homens a Deus segundo as circunstâncias, respondendo ao chamado de Jesus Cristo: venite ad me omnes43, vinde todos a mim; ou para levar Deus aos homens, quando se escuta o Senhor que diz: ecce sto ad ostium et pulso44, olha que estou à porta e bato.

Mas o cristão verdadeiramente zeloso não há de esquecer que deve conservar-se no meio dessas duas atitudes com serenidade e com equilíbrio, pois, se o Senhor diz: ecce venio cito et merces mea mecum est45, eis que venho logo, trazendo comigo o prêmio para recompensar cada um segundo as suas obras, também diz por São Mateus que as almas têm de fazer-lhe força46.

Basta-nos recordar uma passagem maravilhosa ocorrida depois da Ressurreição: o Senhor se une no caminho àqueles discípulos que estão tristes e titubeantes na fé; e, quando abre para eles o sentido das Escrituras, chegados a Emaús, faz como que vai adiante. Cléofas e seu companheiro, com um modo de dizer que possui um não sei quê cheio de ternura divina e humana, lhe rogam: mane nobiscum, quoniam advesperascit, et inclinata est iam dies47; fica conosco, porque sem ti faz-se a noite para nós.

48Se o Filho de Deus se fez homem e morreu numa cruz, foi para que todos os homens sejamos uma só coisa com Ele e com o Pai49. Todos, portanto, estamos chamados a fazer parte desta divina unidade. Com alma sacerdotal, fazendo da Santa Missa o centro da nossa vida interior, procuramos nós estar com Jesus, entre Deus e os homens.

A nossa união com Cristo dá-nos a consciência de sermos com Ele corredentores do mundo, para contribuir a que todas as almas possam participar dos frutos da sua Paixão, conhecer e seguir o caminho da salvação que leva ao Pai.

Não deixarei de repetir: para estarmos unidos com Cristo no meio das ocupações do mundo, devemos abraçar a Cruz com generosidade e com garbo. Sal da nossa vida é a mortificação, filhas e filhos meus, que há de acompanhar delicadamente, inteligentemente, o nosso trabalho diário com o fim de sustentar a nossa vida sobrenatural, da mesma forma como o bater do coração sustenta a vida do corpo.

Assim demonstraremos aos demais homens, que vivem e trabalham em meio às realidades do mundo, o significado da oração sacerdotal de Jesus Cristo: Pater sancte, serva eos in nomine tuo, quos dedisti mihi... Non rogo ut tollas eos de mundo, sed ut serves eos a malo. De mundo non sunt, sicut et ego non sum de mundo50; Pai santo, protege em teu nome estes que me confiaste... Não te peço que os tires do mundo, mas que os preserves do mal; eles não são do mundo, como tampouco eu sou do mundo.

Filhos da minha alma, todas estas são ideias que vêm vindo à minha mente – como acontecerá também convosco – quando, considerando a magnitude da nossa tarefa apostólica no meio das atividades humanas, procuro reter em minha memória, unidas às cenas da morte – do triunfo, da vitória – de Jesus na Cruz, aquelas palavras dEle: et ego, si exaltatus fuero a terra, omnia traham ad meipsum51; quando eu for levantado no alto sobre a terra, atrairei a mim todas as coisas.

Unidos a Cristo pela oração e pela mortificação em nosso trabalho diário, nas mil circunstâncias da nossa vida simples de cristãos comuns, obraremos essa maravilha de pôr todas as coisas aos pés do Senhor, levantado sobre a Cruz, onde se deixou encravar por tanto amor ao mundo e aos homens.

Assim, simplesmente trabalhando e amando a Deus na tarefa que é própria da nossa profissão ou do nosso ofício, a mesma que tínhamos quando Ele veio nos procurar, cumprimos essa missão apostólica de pôr Cristo no cume e na entranha de todas as atividades dos homens: porque nenhuma dessas limpas atividades está excluída do âmbito do nosso labor, que se faz manifestação do amor redentor de Cristo.

Dessa forma, o trabalho é para nós não só o meio natural de enfrentar as necessidades econômicas e de manter-nos em lógica e simples comunidade de vida com os demais homens, mas também – e sobretudo – o meio específico de santificação pessoal que o nosso Pai Deus nos assinalou e o grande instrumento apostólico santificador que Deus colocou em nossas mãos para conseguir que, em toda a criação, resplandeça a ordem querida por Ele.

O trabalho, que há de acompanhar a vida do homem sobre a terra52, é para nós ao mesmo tempo – e em grau máximo, porque às exigências naturais unem-se outras de ordem sobrenatural – o ponto de encontro da nossa vontade com a vontade salvífica do nosso Pai celestial.

Digo-vos mais uma vez, meus filhos: o Senhor nos chamou para que, permanecendo cada um no seu próprio estado de vida e no exercício da sua própria profissão ou ofício, todos nos santifiquemos no trabalho, santifiquemos o trabalho e santifiquemos com o trabalho. É assim que esse trabalho humano que realizamos pode, com farta razão, ser considerado opus Dei, operatio Dei, trabalho de Deus.

O Senhor dá um valor imenso ao trabalho da inteligência e das mãos dos homens, ao trabalho dos seus filhos. Agindo assim, face a Deus, por razões de amor e de serviço, com alma sacerdotal, toda ação do homem atinge um genuíno sentido sobrenatural, que mantém a nossa vida unida à fonte de todas as graças.

Não se trata – vede bem como isto está longe do chamado espírito clerical – de temporalizar a missão sobrenatural de Cristo e da sua Igreja: trata-se do contrário, de sobrenaturalizar a ação temporal do homem. Porque estamos plenamente convictos de que todo trabalho humano legítimo, mesmo que pareça humilde, pequeno e insignificante, pode ter sempre um sentido transcendente: uma razão de amor, algo que fale de Deus e a Deus leve.

É preciso, pois, mostrar aos homens este simples caminho de santidade que se oferece a todos com a magnífica simplicidade das coisas divinas; e o faremos bem se procurarmos pregar esta doutrina com o exemplo vivo do nosso trabalho pessoal intenso, feito com desejo de perfeição – com a maior perfeição, também humana, possível –, com a perfeição que pede o que há de ser oferecido a Deus.

Se exercemos deste modo a nossa própria profissão, se realizamos assim as nossas tarefas no meio do mundo – esse trabalho ou munus de cada um, que é bem conhecido por todos –, os homens aprenderão de nós que é muito possível, também nas normais circunstâncias da vida ordinária, fazer realidade na sua alma o mandato que o Senhor dirigiu a todos: estote ergo vos perfecti, sicut et Pater vester caelestis perfectus est53; sede perfeitos como vosso Pai celestial é perfeito.

Cumprir a vontade de Deus no trabalho, contemplar a Deus no trabalho, trabalhar por amor a Deus e ao próximo, converter o trabalho em meio de apostolado, dar ao humano valor divino: esta é a unidade de vida, simples e forte, que devemos ter e ensinar.

Almas contemplativas no meio do mundo: isso são os meus filhos no Opus Dei, isso haveis de ser sempre para assegurar a vossa perseverança, a vossa fidelidade à vocação recebida. E, em cada instante da nossa jornada, poderemos exclamar sinceramente: loquere, Domine, quia audit servus tuus54; fala, Senhor, que teu servo escuta.

Onde quer que estivermos, no meio do rumor da rua e dos afãs humanos – na fábrica, na universidade, no campo, no escritório ou no lar –, estaremos sempre em simples contemplação filial, num constante diálogo com Deus.

Porque tudo – pessoas, coisas, tarefas – nos oferece a ocasião e o tema de uma contínua conversa com o Senhor: da mesma forma como a outras almas, com vocação diversa, facilitam-lhes a contemplação o abandono do mundo – o contemptus mundi – e o silêncio da cela ou do deserto. A nós, meus filhos, o Senhor pede só o silêncio interior – abafar as vozes do egoísmo do homem velho –, e não o silêncio do mundo: porque o mundo não pode nem deve calar para nós.

Sem esse trato fiel com nosso Pai Deus, ao qual estamos chamados pela nossa própria vocação, posso assegurar-vos que é muito difícil perseverar no Opus Dei. Por isso, tudo o que fizerdes, fazei-o de bom coração, como para o Senhor e não para os homens, certos de que recebereis, como recompensa, a herança das mãos do Senhor. Servi a Cristo, Senhor55.

Com essa unidade de vida, com este afã de contemplação no meio do mundo – no meio da rua: ao ar, no sol, sob chuva –, não só vos dominará o desejo de permanecer na tarefa temporal, de não vos afastar das realidades terrenas, mas o afã apostólico vos arrastará para penetrar corajosamente em todas essas realidades seculares, para desentranhar as exigências divinas que contêm; para ensinar que a fraternidade dos filhos de Deus – a fraternidade humana tem sentido sobrenatural – é a grande solução que se oferece aos problemas do mundo; para tirar os homens da sua carapaça de egoísmo; para garantir, ao mesmo tempo, a necessária personalidade e a verdadeira liberdade, qua libertate Christus nos liberavit56, aos que estão como que dissolvidos na massa; para, numa palavra, abrir aos homens os caminhos divinos da terra.

Bem vedes, filhas e filhos meus, como são grandes os horizontes apostólicos que traz a consideração destes aspectos característicos da nossa espiritualidade, enxertados todos no fio comum da filiação divina.

Deveis estar muito agradecidos a Deus por nos ter dado esta espiritualidade tão sincera e simplesmente sobrenatural, e ao mesmo tempo tão humana, tão perto das nobres ocupações terrenas. É graça muito especial – luz de Deus, vos dizia –, a qual recebemos pela sua misericórdia e com humilde fidelidade havemos de transmitir a muitas outras almas.

Mas tende em conta que, em não poucas ocasiões, esta espiritualidade e esta ascética custaram e custam ao vosso Padre e a alguns irmãos vossos o ter de suportar a incompreensão, o ter de ouvir que se tacha de loucura – e até de heresia – o que é caminho de Deus e de loucos e hereges os que o seguem.

Permite o Senhor muitas vezes que, por trás das obras de Deus, vá a incompreensão e, até mesmo, a difamação e as perseguições, do mesmo modo como depois da luz vem a escuridão. São promovidas frequentemente por pessoas boas com muita cegueira, que não querem saber de nada que não seja a sua rotina, a sua comodidade ou o seu egoísmo e que na sua vida fogem de toda complicação.

E assim, até no ambiente eclesiástico, entre tantas pessoas santas ou – pelo menos – cumpridoras do dever, encontram-se muitas outras sem zelo, que são burocratas da Igreja de Deus e dão a impressão de que não se importam com as almas. Uns e outros não compreendem os termos espirituais: quando se fala com eles, parecem-lhes vazios, não tentaram vivê-los.

Certa vez pensei que, mesmo que seja pouca a preparação que tenham, deveriam aperceber-se do grave dever que deve instar-lhes a pedir informações, a escutar o acusado, a estudar a sua doutrina: a doutrina que o acusado propõe e os frutos que dá.

Calo e calarei, enquanto puder calar; mas sinto claramente que a defesa do espírito da Obra é a defesa da nossa amizade com Deus, que nos diz: ergo iam non estis hospites et advenae, sed estis cives sanctorum et domestici Dei57; já não sois estranhos e forasteiros, mas concidadãos dos santos e familiares de Deus.

Com essa cegueira ou com esse comodismo, não podem compreender que a liberdade – a liberdade pessoal – seja um ponto principalíssimo do espírito da Obra de Deus: não podem compreender que a maior parte das vezes utilizemos o eu, fazendo-nos responsáveis dos nossos atos, e que rara vez podemos dizer nós, pois os demais irmãos nossos – os demais membros do Opus Dei, direi melhor – não têm a obrigação de seguir o critério determinado que tenha um membro do Opus Dei nas coisas temporais, nem nas teológicas que a Igreja deixe à discussão dos homens. É um consolo ler no Santo Evangelho aquele neque enim fratres credebant in eum58, ninguém acreditava em Jesus Cristo.

Há outras pessoas que, querendo fazer-nos pesar a experiência de seus anos velhos, olham para nós com preconceito. Eu, pelo contrário, penso – e vós comigo – que o velho e o novo podem estar cheios de vitalidade: a criança, o jovem, o homem que entrou na maturidade ou na velhice, podem estar sadios, igualmente sadios, de corpo e de alma. E a idade leva-os a dar-nos conselhos – que não pedimos – com o preconceito e a prudência do velho, quando o que precisamos é de orações, compreensão e carinho.

59Tudo isso passará; enquanto isso, lutemos na nossa vida interior, nessa luta ascética que nos enche de otimismo e de alegria, de paz e de esperança. E repitamos aquelas palavras que eram para mim uma jaculatória nos primeiros anos da nossa Obra, uma oração, se quereis, demasiado ingênua, mas que é a mesma que, segundo São João, fizeram os discípulos do Mestre: nunc scimus quia scis omnia60.

Agora continuo a dizê-la: Deus sabe mais. Meus filhos, eramus enim aliquando tenebrae, nunc autem lux in Domino: ut filii lucis ambulate61; éramos em outros tempos trevas, agora somos luz no Senhor: iremos para a frente como filhos da luz.

Perante as contradições, sentiremos este Jesus que diz a Paulo e, em Paulo, a nós: sufficit tibi gratia mea, nam virtus in infirmitate perficitur62; basta-te a minha graça, porque meu poder brilha e consegue o seu fim por meio das tuas fraquezas.

Podeis dizer com certeza, com humildade e com fortaleza, a esses que nos aviltem, as últimas palavras do Apologético de Tertuliano: tal é a contradição entre as obras divinas e as humanas que, quando vós nos condenais, Deus nos absolve63.

No entanto, esta novidade nossa, meus filhos, é tão antiga como o Evangelho. Desde que Jesus Cristo disse ser o Caminho, a Verdade e a Vida64, convidando todos a segui-lo65, brotou com força na alma de muitos fiéis – desde os primeiros tempos da Igreja – o desejo de tornar realidade a busca da perfeição traçada pelo Evangelho e praticada exemplarmente pelo próprio Jesus Cristo: vida de santidade pessoal e de atividade apostólica.

Assim, a autêntica espiritualidade do Evangelho foi produzindo frutos abundantes de santidade em todos os ambientes daquela sociedade pagã que rodeava os cristãos da primeira hora. São homens e mulheres que vivem sinceramente a sua fé e que são, portanto, proselitistas; que trabalham com naturalidade entre os demais – se cidadãos, como cidadãos; se escravos, como escravos; que praticam uma delicada fraternidade e se dedicam a Deus e à difusão da Boa-nova, na medida dos dons que cada um recebeu66. O resultado foi a cristianização de toda a sociedade pagã.

67Não faltaram desde então, ao longo dos séculos, almas que procuraram seguir de perto o exemplo de Jesus Cristo: mas, progressivamente, foram concentrando seu esforço em viver – no exercício publicamente professado – três conselhos, que se fizeram tradicionais: a pobreza, a castidade e a obediência, que ficaram assim tipificados como pilares ascéticos de certo estado de vida, diferente daquele dos simples fiéis.

Deste modo delineou-se a condição própria do estado religioso, que, nas suas diversas formas evolutivas ao longo da história, requereu sempre – como elemento substancial – uma separação mais ou menos completa do mundo, das tarefas e das atividades seculares.

Para as almas que recebem de Deus essa vocação, as ocupações e os trabalhos temporais do simples cristão constituem um impedimento que se há de abandonar – como condição sine qua non – para buscar a própria santificação – vivendo a vida de perfeição evangélica – e para promover a salvação dos demais desde fora do mundo, com a oração, a penitência e as obras de apostolado compatíveis com esse estado de vida.

Isso não quer dizer que não tenha havido também outras almas que procuraram dedicar-se ao cumprimento perfeito da vontade de Deus sem se afastarem dos seus trabalhos cotidianos e da condição e estado de vida que tinham no mundo: houve – habitualmente isoladas –, e a Igreja elevou aos altares algumas delas.

A imensa maioria dessas almas, no entanto, permaneceu na escuridão, passou em silêncio, inobservada, sem que mal se possa saber até que ponto a sua vida santa foi exemplo para outras pessoas e contribuiu para manifestar a santidade da Igreja.

Com o exemplo dessas criaturas extraordinárias, como que numa semiobscuridade – pelo menos prática – ficou também a doutrina clara de que todos os batizados, mesmo permanecendo na sua vida normal de trabalho no meio do mundo, podem e devem santificar-se e ser levedura poderosa de vida cristã68.

69Existem almas generosas, homens ou mulheres, que sentem o desejo de trabalhar com todas as suas forças na vinha do Senhor. No entanto, não têm vocação religiosa, nem desejam a vida de perfeição evangélica, mas quiseram tornar realidade, no meio do mundo e da vida ordinária, seus desejos de dedicar-se a buscar a perfeição cristã e exercer o apostolado.

Essas pessoas com fome de perfeição sabem que não faltam ambientes – os quais também são de Deus – fechados com fronteiras que um sacerdote ou um religioso, pela natureza de sua vocação, não pode ultrapassar. A descristianização progressiva da sociedade moderna oferece uma prova eloquente de que a vida humana, as profissões e as atividades sociais estão muitas vezes longe da Igreja e das tarefas próprias das pessoas consagradas a seu serviço.

Pois bem, filhas e filhos meus – como parte da providência de Deus no cuidado da sua Igreja Santa e na conservação do espírito do Evangelho –, desde o dia 2 de outubro de 1928, o Senhor encomendou ao Opus Dei a tarefa de tornar bem patente, de recordar a todas as almas, com o exemplo da vossa vida e com a palavra, que existe um chamado universal à perfeição cristã e que é possível segui-lo.

O que o Senhor quer é que cada um de vós, nas circunstâncias concretas da própria condição no mundo, procure ser santo: haec est enim voluntas Dei, sanctificatio vestra70; esta é a vontade de Deus, a vossa santificação. Santidade muitas vezes escondida – sem brilho externo –, diária, heroica: para corredimir com Cristo, para salvar as criaturas com Ele, para ordenar com Ele todas as coisas humanas.

Deus quer servir-se da vossa santidade pessoal, buscada segundo o espírito da Obra, para ensinar a todos, de uma maneira peculiar e simples, o que vós bem sabeis: que todos os fiéis, incorporados a Cristo pelo batismo, estão chamados a buscar a plenitude da vida cristã.

O Senhor quer-nos instrumentos dEle, para recordar na prática – também vivendo-o – que o chamado para a santidade é universal em concreto, e não exclusivo de uns poucos, nem de um estado de vida determinado, nem condicionado em geral pelo abandono do mundo: que qualquer trabalho, qualquer profissão, pode ser caminho de santidade e meio de apostolado.

Esta é, filhos, doutrina segura, luz de Deus. Doutrina que dificilmente poderá ser entendida por aqueles que não concebem a perfeição cristã ou a contemplação fora do estado religioso, mas que está fundamentada na Sagrada Escritura e na Tradição da Igreja, confirmada pela experiência que nos proporciona continuamente, apesar da nossa pequenez pessoal, a vida do Opus Dei.

71A Obra tem um fim exclusivamente sobrenatural; por isso, faz parte do seu espírito a liberdade pessoal de cada um dos seus membros; e por isso também não excluímos ninguém do nosso trabalho, nenhuma alma que queira vir compartilhar dos nossos afãs, ainda que não tenha a nossa fé.

Sabeis bem que não existe nenhum absolutismo possível dentro da nossa família espiritual; vão-se tomando todas as precauções para evitar esse dano, fazendo com que o governo seja colegial. No entanto, dentro do Opus Dei, no fundamental, não haverá nenhuma desagregação viável, não haverá opiniões: estamos consummati in unum72. Temos um breve denominador comum, que é a doutrina da Igreja e, dentro dela, o espírito característico da Obra e a maneira peculiar de exercer o apostolado no meio da rua, buscando a santidade pessoal e a de todos os que nos rodeiam; e um numerador amplíssimo, um mar sem praias, sempre conforme a geografia e o tempo, em que as diversas opiniões são e serão constantemente prova de bom espírito, manifestação patente de que – no Opus Dei – não há tiranos nem escravos.

O Senhor deu-nos luz suficiente para compreender algo que está na história dos homens: quem foi escravizado, geralmente, depois se torna déspota. No entanto, na Obra existe uma ordem, tem de existir; caso contrário, o nosso Opus Dei não poderia ser instrumento para servir às almas, para servir à Igreja, para ser fiel ao Magistério do Romano Pontífice.

Mas esta ordem, vivida tanto com uma docilidade extremada e voluntária quanto com liberdade, é – creio que me compreendereis – uma organização desorganizada; por isso volto a repetir: no temporal e no teológico que não é de fé, as opiniões são admitidas e respeitadas, como uma sadia manifestação de bom espírito.

A Obra tem três características mais: com a alegria, o amor ao trabalho e o amor à pobreza. Daremos a Deus o melhor, ao culto divino – que exercemos, habitualmente, em pequenos oratórios – consagraremos com esforço uma atenção que torne impossível que lhe dediquemos o sacrifício de Caim: apenas quando um homem vier a presentear a mulher amada, como prova de afeto, com um saco de cimento e três barras de ferro – disse-vos –, é que faremos nós o mesmo com Nosso Senhor, que está nos céus e em nossos Tabernáculos.

A nossa pobreza, meus filhos, não há de ser clamorosa pobretice; a nossa pobreza anda oculta com um sorriso, com a limpeza do corpo e a limpeza da roupa e, acima de tudo, com a limpeza da alma. Não esperemos – portanto – um louvor na terra, mas não esqueçamos aquelas palavras de São Mateus: Pater tuus, qui videt in abscondito, reddet tibi73.

Por isso devemos viver sempre o que é natural no homem, com sentido sobrenatural. Por isso podemos tornar divinas as coisas da terra. Por isso, para nós não é sacrifício aceitar a nossa vocação; não é sacrifício, pois sabemos que é uma prova de eleição e de amor: redemi te, et vocavi te nomine tuo, meus es tu74.

Assim, poderá ser dito de nós o que o salmista diz do Senhor, Redentor nosso e Modelo nosso: exsultavit ut gigas ad currendam viam, sendo nós tão pequenos, a summo caelo egressio eius et occursus eius usque ad summum eius; alegrar-me-ei como gigante que corre pelo seu caminho e vai de um extremo a outro, que desemboca no céu, chegando até os mais longínquos confins; nec est qui se abscondat a calore eius75, não há quem possa esconder-se, e todos recebem o calor.

E, ao ver as maravilhas que o Senhor está já começando a fazer por vossas mãos, em tantas criaturas que se aproximam de nós, não teremos a tentação do orgulho, porque no fundo do coração ressoará aquele versículo do salmo: Tu es, Deus, qui facis mirabilia: nota fecisti in populis virtutem tuam76; só Tu és, Senhor, quem faz coisas admiráveis, e assim fazes que as gentes conheçam o teu poder.

Portanto, nolite itaque errare, fratres mei dilectissimi: omne datum optimum, et omne donum perfectum, desursum est, descendens a Patre luminum, apud quem non est transmutatio nec vicissitudinis obumbratio77; toda dádiva boa e todo dom perfeito bem sabeis que provém do alto, desce do Pai das luzes, em quem não cabe mudança nem sombra de variação.

Quando pratiqueis toda esta doutrina, às vezes falar não será suficiente: tereis necessidade de cantar por amor, como esses jovens que cantam pela rua; mas vós fareis canções de amor humano à maneira divina, e vos sentireis como aqueles criaturas de que fala Ezequiel para representar os evangelistas do Senhor: ibant et revertebantur in similitudinem fulguris coruscantis78; andareis pelo mundo dando luz, como tochas acesas que lançam faíscas.

O Espírito Santo faz com que a nossa Mãe, a Igreja de Jesus Cristo, realidade viva e sempre atual – moderna e antiga –, encontre continuamente, com a fidelidade ao depósito rico e bem guardado que lhe foi confiado, as energias necessárias para renovar a sua juventude e para encontrar o modo de transmitir, segundo os tempos – adaptando-se à linguagem dos homens, compreendendo a sua mentalidade –, a mensagem cristã a todas as almas: nova et vetera, dilecte mi, servavi tibi79; guardei para ti, caríssimo, o novo e o velho, lê-se no Cântico dos Cânticos.

E no Evangelho está escrito que omnis scriba doctus in regno coelorum similis est hominis patrifamilias, qui profert de thesauro suo nova et vetera80; todo homem douto na ciência de Deus é semelhante ao pai de família que vai extraindo do seu tesouro coisas novas e coisas antigas.

O nosso espírito é assim, velho como o Evangelho – escrevi-vos sempre – e, como o Evangelho, novo; a própria natureza da nossa vocação, o nosso modo de buscar a santidade e de trabalhar pelo Reino de Deus, leva-nos a falar das coisas divinas com a mesma linguagem dos homens, a ter os mesmos costumes saudáveis que tenham, a compartilhar de sua reta mentalidade, a ver a Deus – eu diria – do mesmo ângulo, secular e laical, a partir do qual eles consideram, ou podem considerar, os problemas transcendentais da sua vida: a não ser nunca um modelo glacial que se possa admirar, mas não amar.

Viemos, pois, recolher com juventude o tesouro do Evangelho, a fim de fazê-lo chegar a todos os cantos da terra. Mas não viemos revolucionar nada. Bebemos o bom e maduro vinho da autêntica doutrina católica, respeitando e amando tudo o que o Senhor promoveu ao longo de tantos séculos, em serviço da sua Igreja Santa.

Spiritus ubi vult spirat, et vocem eius audis, sed nescis unde veniat aut quo vadat81; o Espírito sopra onde quer, e ouves a sua voz, mas não sabes de onde vem ou para onde vai. Esta foi a minha vida – escrevo-o com emoção e com agradecimento ao meu Deus, percebendo que sou um pobre pecador – de há muitos anos: muito tempo antes de que o Senhor, derramando graça abundante – encontrava-me então sozinho, com a única bagagem dos meus vinte e seis anos e do meu bom humor –, me chamasse claramente para trabalhar na sua Obra, com uma vocação bem definida.

A Obra está indo adiante na base da oração: da minha oração – e das minhas misérias –, que aos olhos de Deus força o que exige o cumprimento da sua Vontade; e da oração de tantas almas – sacerdotes e leigos, jovens e velhos, sãos e enfermos – às quais recorro, certo de que o Senhor as escuta, para que rezem por uma determinada intenção que, no começo, só eu conhecia. E, com a oração, a mortificação e o trabalho dos que vêm junto de mim: estas foram as nossas únicas e grandes armas para a luta.

Assim vai – assim irá – a Obra fazendo-se, crescendo, em todos os ambientes: nos hospitais e na universidade; nas catequeses dos bairros mais necessitados; nos lares e nos lugares de reunião dos homens; entre os pobres, os ricos e as gentes da mais diversa condição, para fazer chegar a todos a mensagem que Deus nos confiou.

Uma missão que a Obra se lançou a cumprir diretamente, com generosidade, sinceramente, sem subterfúgios nem patrocínios humanos, sem recorrer – valha o exemplo – ao contínuo salto à procura do sol que mais aquece ou da flor mais rica e vistosa: o sol está em nosso interior e o labor se realiza – como deve ser – na rua, e se dirige a todos.

Nestes anos do começo, sinto-me cheio de profunda gratidão a Deus. E ao mesmo tempo penso, meus filhos, no muito que nos resta percorrer para semear em todas as nações, por toda a terra, em todas as ordens da atividade humana, esta semente católica e universal que o Opus Dei veio espalhar.

Por isso, continuo a me apoiar na oração, na mortificação, no trabalho profissional e na alegria de todos, enquanto renovo constantemente a minha confiança no Senhor: universi, qui sustinent te, non confundentur82; nenhum dos que põem a sua esperança em Deus será confundido.

Meus filhos, peço-vos que vos unais sempre e continuamente às minhas intenções, enchendo-vos também de confiança, enquanto vos preparais para continuar a trabalhar com renovada juventude pela expansão da Obra: qui replet in bonis desiderium tuum, renovabitur ut aquilae juventus tua83; porque Nosso Deus tornará realidade fecunda os desejos que pôs em nossos corações, e será sempre robusta e jovem a nossa tarefa espiritual na terra.

O Senhor espera de vós e de mim que, gozosamente agradecidos pela vocação que a sua infinita bondade pôs em nossa alma, formemos um grande exército de semeadores de paz e de alegria nos caminhos dos homens, de maneira que logo sejam inumeráveis as almas que possam repetir conosco: cantate Domino canticum novum: cantate Domino omnis terra84; cantai ao Senhor um cântico novo; seja toda a terra um cântico de louvor a Deus.

Os filhos de Deus na sua Obra, sentindo e vivendo sinceramente a filiação divina, unidos pelos laços fortes do amor fraterno, poderemos facilmente ser – já vo-lo disse – uma organizada desorganização apostólica no mundo, uma transfusão contínua da força vital cristã na torrente circulatória da sociedade.

O Senhor quer que, sozinhos, com o apostolado pessoal de cada um, ou unidos a outras pessoas – talvez afastadas de Deus, ou até mesmo não católicas, nem cristãs –, planejeis e leveis a termo no mundo todo tipo de serenas e belas iniciativas, tão variadas como a face da terra e como o sentir e o querer dos homens que a habitam, que contribuam para o bem espiritual e material da sociedade e que possam se converter para todos em ocasião de encontro com Cristo, em ocasião de santidade.

Em todo caso, o grande meio à vossa disposição para realizar uma e outra forma de apostolado – cada um por conta própria ou unido a outros cidadãos – é o vosso trabalho profissional. Por isso, tenho vos repetido tantas vezes que a vocação profissional de cada um de nós é parte importante da vocação divina; por isso também, o apostolado que a Obra realiza no mundo será sempre atual, moderno, necessário: porque, enquanto houver homens sobre a terra, haverá homens e mulheres que trabalhem, que tenham determinada profissão ou ofício – intelectual ou manual – a que deverão santificar e que se servirão do seu trabalho para santificar-se e levar os demais a tratar a Deus com simplicidade.

O vosso trabalho, o vosso apostolado – que haverá de ser necessariamente muito proselitista, como o dos primeiros cristãos –, atrairá pessoas com vontade de trabalhar, com têmpera, com nervo, com espírito firme, mais constantes do que brilhantes, audazes, sinceras, com amor pela liberdade e – por isso mesmo – capazes de viver a nossa entrega; capazes de serem Opus Dei na sua vida, no seu trabalho. E isso não obstante jamais tivesse passado pela sua mente – muitas vezes porque vivem na gentilidade – a possibilidade de ser felizes na amizade com Deus e de levar uma vida de dedicação e de serviço.

São numerosos, bem sabeis disso por experiência pessoal, os caminhos da misericórdia divina. Devem chegar à Obra pessoas de todas as raças e de todas as línguas; jovens e velhos, solteiros e casados, sãos e enfermos: cada um ocupa o lugar que tem assinalado pela vontade de Deus, cada um deve aproveitar a oportunidade – a graça especialíssima – que lhe oferece a bondade do Nosso Senhor.

Pensando neste caminho, com sabor de primitiva cristandade, que Deus suscitou para renovar, de um modo tão admiravelmente simples, os milagres da graça na vida de tantas almas, regozijo-me relendo devagar o que escrevia São Justino, admirado como estava ante o poder admirável do Evangelho.

Os que antes nos comprazíamos com a devassidão, agora abraçamos só a castidade; os que nos entregávamos às artes mágicas, agora nos consagramos ao Deus bom e ingênito; os que amávamos acima de tudo o dinheiro e o aumento dos nossos bens, agora, mesmo o que temos, pomo-lo em comum e doamos parte a quem estiver necessitado; os que nos odiávamos e nos feríamos uns aos outros e, separados por modos diversos de viver, não compartilhávamos o lar com aqueles que não eram da mesma raça, agora, depois da vinda de Cristo, vivemos todos juntos e rogamos pelos nossos inimigos e tentamos dissuadir aos que nos perseguem com ódio, a fim de que, vivendo conforme os belos exemplos de Cristo, tenham boa esperança de alcançar, junto conosco, os mesmos bens que nós esperamos de Deus, soberano sobre todas as coisas85.

Qualquer pessoa pode ser da Obra se Deus a chamar; a sua vocação não deve acarretar nenhuma mudança de estado e, portanto, nenhuma mudança exterior. Cada um permanecerá no lugar que ocupa no mundo, com o seu trabalho, com a sua mentalidade, com seus compromissos profissionais, com as suas obrigações para com a coletividade e com as suas relações sociais: porque todas as relações são meios para o seu labor específico de cristão.

A Obra de Deus dar-lhe-á seu peculiar espírito sobrenatural – a sua ascética específica – e a formação doutrinal adequada, com o fim de que possa santificar-se e realizar o seu Opus Dei precisamente em e através dessas mesmas relações humanas.

Mas, dentro dessa necessária unidade de espírito e de formação, cada membro do Opus Dei atua no mundo – nas suas atividades temporais, de caráter profissional, cultural, político, social etc. – com plena liberdade e, portanto, com responsabilidade pessoal: uma responsabilidade completa e exclusiva que cada um assume, como consequência lógica da liberdade absoluta de opinião e de ação, dentro dos limites da fé e da moral de Jesus Cristo.

O fato teológico e apostólico da Obra é, pois, tão peculiar e tão diverso de uma vocação religiosa e da condição de vida que essa vocação traz consigo que certamente nenhuma pessoa – que deseje ser admitida no Opus Dei – teria pensado antes em entregar-se a Deus no estado religioso, nem em ir para o seminário. Com razão podemos afirmar, por isso, que não afastamos ninguém de nenhum desses outros caminhos.

A Obra não tem, não deve ter, embora os amemos para os outros, seminários menores ou escolas apostólicas aonde as mães, cheias de bons desejos – de desejos santos –, levam seus filhos desde que são muito pequenos para ver se, vivendo num meio especialmente apto, pode nascer neles a vocação sacerdotal ou a vocação religiosa.

Os que pedem admissão à Obra – como já têm idade mais do que suficiente – fazem-no com um conhecimento claro da entrega pessoal que supõe a chamada para o Opus Dei e da missão apostólica peculiar que hão de realizar.

Solicitam ser admitidos depois de amadurecer as coisas devagar e livremente; tomam a decisão em consciência, com capacidade responsável e com conhecimento da sua liberdade para se decidirem ou não, depois de compreender os deveres que adquirem ao aceitarem o específico chamado de Deus para a sua Obra.

Não há ninguém mais interessado do que nós mesmos em que venham ao Opus Dei só aqueles que tiverem verdadeiramente esta específica vocação divina e queiram entregar-se e perseverar com plena liberdade: porque essa é a melhor garantia de que, com a ajuda da graça de Deus, serão eficazes.

Ao mesmo tempo, bem sabeis que é próprio do nosso espírito ver com alegria o surgimento de muitas vocações para os seminários e para as famílias religiosas. Mais ainda, damos graças a Deus, porque não poucas dessas vocações brotam como fruto do labor de formação espiritual e doutrinal que fazemos entre a juventude: ao acender cristãmente o ambiente que nos rodeia, ao torná-lo mais sobrenatural e mais apostólico, promove-se logicamente um maior número de almas para todas as instituições da Igreja.

Com especial cuidado procederemos assim quando se trata de vocações para o estado religioso. Desde o primeiro momento da fundação do Opus Dei, tenho visto a Obra como uma instituição cujos membros não podem ser religiosos, nem viver ad instar religiosorum – à maneira dos religiosos –, nem ser equiparados de nenhum modo aos religiosos.

E isso não por falta de afeto pelos religiosos, que amo e venero com todas as minhas forças; e de tal modo, meus filhos, que posso repetir com absoluta sinceridade, referindo-me a essas almas, as mesmas palavras de São Paulo aos fiéis de Filipos: testis enim mihi est Deus, quomodo cupiam omnes in visceribus Iesu Christi86; Deus é testemunha de quanto os amo, nas entranhas de Jesus Cristo.

Veneramos e respeitamos profundamente a vocação sacerdotal e a religiosa, bem como todo o imenso labor que os religiosos realizam e realizarão em serviço da Igreja: por isso, não seria bom filho meu quem não tivesse esse espírito.

Mas, ao mesmo tempo, repetimos que o nosso chamado e o nosso labor – porque são um convite a permanecer no mundo, e porque as nossas tarefas apostólicas se fazem em e a partir das atividades seculares – se diferenciam totalmente da vocação e do labor encomendado aos religiosos.

Estais entregues ao Senhor com a condição precisa de não mudar de estado – de não serdes religiosos, nem pessoas assimiladas aos religiosos –, de permanecer no meio do mundo em perfeita comunhão de vida e de tarefa com os demais fiéis do povo de Deus, iguais a vós.

O trabalho que realizamos, a mentalidade e os meios com que o levamos a termo, as circunstâncias nas quais o desenvolvemos e a formação e ascética específicas que nos preparam para essa tarefa são coisas que não fazem parte do esquema teológico e jurídico do estado religioso.

87A nossa tarefa é também muito diversa da que habitualmente fazem outros leigos em associações ou movimentos de diverso tipo, promovidos mais ou menos diretamente pela Hierarquia ordinária da Igreja ou por ordens e congregações religiosas.

São associações ou movimentos que não exigem uma dedicação plena ao exercício do apostolado; com um vínculo débil, quase inexistente ou praticamente nulo, que une bem pouco os membros da associação; também com uma falta de profundidade – não precisam mais –, de rigor e de continuidade na formação ascética e doutrinal, a qual de fato – por outro lado – não se pode dizer que seja indispensavelmente necessária para os seus fins.

Porém, ainda que possuíssem todas essas coisas, faltaria para eles sempre essa união íntima e total entre o trabalho profissional e o trabalho apostólico que caracteriza fundamentalmente a vocação específica e as específicas exigências ascéticas dos membros da Obra; que traz, como consequência prática, que nem o Opus Dei nem seus membros precisem do dinheiro de ninguém, pois se sustentam com o fruto do trabalho profissional, muito embora, pelo contrário, para o bom desenvolvimento das obras apostólicas que realizamos, seja indispensável a colaboração generosa de pessoas católicas ou não, que com a sua oração, seu trabalho e seu dinheiro fortaleçam a eficácia.

Ao chegar a este ponto, parece-me oportuno comentar-vos em concreto algumas das razões que podem explicar – não justificar – a postura de certas pessoas que talvez não procurem entender o nosso caminho ou que se mostram incapacitadas de entendê-lo. Assim, ainda que seja de um modo um pouco negativo, ficarão mais patentes certas afirmações que definem a nossa espiritualidade e a nossa tarefa apostólica.

Os que estão acostumados a louvar o artificial, a se recrearem nas coisas raras ou falsas e a ignorar a beleza das que são preciosas e genuínas – julgam mais belas as flores que não são naturais; quem não ouviu falar, como louvor a umas rosas frescas e viçosas: como são belas, parecem de pano!? – não poderão descobrir facilmente nas obras apostólicas o que é fruto, maravilhoso mas simples, da graça de Deus, da sua providência ordinária e do trabalho esforçado e nobre.

Se estão habituados a fazer espetáculo, com ruído – com abundância de fogos de artifício –, essa disposição de ânimo, que talvez dura vários séculos, pode ter formado neles uma consciência peculiar, uma mentalidade que os torna inaptos a ver – não a crer: apalpa-se – que os demais não usam de gestos postiços nem de segredices, que procedem com toda a simplicidade e naturalidade, ingenuamente e, portanto, humildemente.

Se são superficiais e estão acostumados a desvirtuar, com leviandade e desconsideração, o legítimo sentido que, em determinadas vocações específicas, podem ter elementos respeitáveis, mas não essenciais para a verdadeira procura da perfeição cristã – cores e formas de hábito, cerimônias longas e solenes, cordões, cintos, crucifixos atravessados sobre o peito, medalhas à vista etc.: signos nos quais se manifesta, com alguma frequência, um certo classismo, lamentado pela Igreja em mais de uma ocasião –, dando-lhes importância capital, essas pessoas, digo, sentir-se-ão movidas a duvidar da presença de um verdadeiro caminho de santidade se percebem a falta absoluta desses elementos tradicionais.

E no nosso caso, meus filhos, faltam todos; nem sequer existe, nem pode existir, uma sigla para o nome da Obra, simplesmente porque não temos nada a ver com o estado religioso: somos cidadãos comuns, iguais aos demais cidadãos.

Se ignoram o que significa a dedicação completa a um trabalho profissional sério, à ciência profana, estarão muito longe de poder avaliar o alcance e a envergadura do trabalho apostólico que Deus pede aos membros da Obra e o modo como o realizam.

Se estão habituados a se servirem da Igreja para seus fins de vaidade pessoal, a mandar sem freio, a atropelar, a querer intrometer-se em tudo, por princípio serão inimigos de qualquer tarefa em que se limitem com justiça seus desejos de dominar, porque considerarão que se atenta contra a sua autoridade e talvez, também, contra seus interesses econômicos.

Tampouco nos pode estranhar, meus filhos, embora seja doloroso comprová-lo, que haja pessoas que, inconscientemente, formem o entorno natural dessas pessoas às quais acabo de aludir, deixando-se levar por lugares-comuns – que é necessário deitar abaixo, porque limitam e condicionam a ação divina e a vitalidade da Igreja – e por preconceitos que nascem do erro, da falta de doutrina.

Essas outras pessoas às quais agora me refiro, embora sejam honestas, não conseguem ver a retidão e a legitimidade de um horizonte de aspirações nobres tão aberto ante seus olhos como o que oferece a Obra; embora sejam boas, não resistem ao martelar da informação unilateral ou equivocada levada por gente aparentemente respeitável; embora sejam incapazes de fazer o mal, não fazem o bem, por medo aos poderosos; embora sejam inteligentes e mesmo doutas, não percebem a eficácia do serviço a Deus e à sua Igreja que se desenvolve na sua presença, nem a doutrina teológica que o sustenta, nem a norma jurídica que requer.

Tudo isso, filhas e filhos meus, nada importa. Se quis fazer um inciso para aludir a essas dificuldades, é apenas porque a sua consideração nos ajuda – por contraste – a perfilar melhor os traços característicos do nosso espírito. De resto, rezai com confiança filial em nosso Pai Deus, desculpai a todos e esperai.

Quando o Céu julgar chegada a hora, fará com que abramos – na organização do apostolado da Igreja – o leito por onde deve transcorrer este rio caudaloso que é a Obra e que, nas circunstâncias atuais, não tem ainda um lugar adequado onde se assentar: será tarefa árdua, penosa e dura. Será preciso superar muitos obstáculos, mas o Senhor nos ajudará, porque tudo na sua Obra é Vontade dEle.

Rezai. Vivei unidos à minha oração contínua: Domine, Deus salutis meae: inclina aurem tuam ad precem meam88. Dizei comigo: Senhor, Deus Salvador nosso, escuta a nossa oração. Sem que nunca vos falte a convicção profunda de que as águas passarão através das montanhas: inter medium montium pertransibunt aquae89. São palavras divinas: as águas passarão.

Enquanto passa o tempo, fazei o propósito de praticar, como eu fiz, o convite que recebi há pouco em Burjasot, durante uns dias de pregação a um grupo de universitários – alguns já sois filhos meus – que se preparavam para melhorar a sua vida cristã. Sobre uma porta, reli com agrado uma inscrição que dizia: cada caminhante siga o seu caminho. Isto é o que nós devemos fazer: esforçar-nos cada vez com mais empenho para conhecer bem o caminho específico ao qual Deus Nosso Senhor nos trouxe, e segui-lo fielmente.

90Ao nos aprofundarmos no conhecimento da nossa vocação, ao considerarmos o valor e as possibilidades deste nosso modo peculiar de levar a mensagem evangélica a todos os homens, salta aos olhos, filhas e filhos meus, que – sendo assim e trabalhando assim – a Obra inteira equivale a uma grande catequese, feita de forma viva, simples e direta na entranha da sociedade civil.

Verdadeiramente, este apostolado doutrinal está fazendo muita falta, até mesmo em grupos sociais e países de velha tradição cristã, onde a ignorância religiosa cresce de dia para dia. Bem se poderia dizer que o maior inimigo de Deus – porque se ama a Deus depois de conhecê-lo – é a ignorância: origem de tantos males e obstáculo grande para a salvação das almas.

Aquilo que nos narra a Escritura – nem sequer ouvimos se há um Espírito Santo91 – é retrato ainda vivo da carência de doutrina clara na mente de muitos homens, de muitos cristãos; de pessoas pouco instruídas e de outros que têm fama de sábios nas ciências humanas; de homens com prestígio na sua profissão, ou que desempenham tarefas de governo.

E, com a ignorância, nasce a confusão, fomentada também com todos os meios de difusão oral e escrita – meios rápidos, capilares – pelos inimigos da Igreja ou por pessoas imprudentes, através de iniciativas, expressões e costumes aparentemente inócuos, mas que contêm em si o erro ou levam ao erro.

Da mesma forma como é esmola material a ajuda aos que estão doentes, aos que são pobres, a ajuda aos que têm pobreza de doutrina é também esmola: esmola, caridade espiritual, que devemos distribuir oportunamente, de mãos cheias.

É preciso dar doutrina para afogar o mal em abundância de bem. A verdade não pode ser artigo de luxo92. É necessário semear abundantemente entre os fiéis a boa doutrina, a doutrina segura – com a convicção de que o que propõe o Magistério como verdade de fé permanecerá irremovível –, deixando e ensinando a liberdade sobre o que é opinável.

Semear, meus filhos, com clareza, sem ambiguidades; porque não podemos permitir que impere o ceticismo prático: a verdade é uma só. Com dom de línguas – costumo dizer, recordando com gozo a vinda do Espírito93 –, que sabe acomodar-se sempre à condição, à capacidade e à formação de quem escuta, que é fruto do oportuno preparo de quem fala e do amor e da fé com que realiza essa tarefa apostólica94.

Ao desejo que tendes de melhorar continuamente a vossa formação, ao vosso afã de aprender, a Obra corresponde proporcionando-vos, na medida e na forma que requerem as circunstâncias pessoais de cada um, um conhecimento exato do dogma e da moral, da Sagrada Escritura e da liturgia, da história e do direito da Igreja; de maneira que possais elevar mais facilmente ao plano sobrenatural os conhecimentos humanos e fazer deles instrumentos de apostolado.

Mas deveis adquirir também o preparo profissional adequado – cada um aquele que é próprio da sua ocupação na sociedade, do seu emprego público intelectual ou manual – para poder realizar com eficácia esse apostolado da doutrina, através das vossas atividades pessoais, do vosso trabalho ordinário.

Dificilmente poderá ser santificado o trabalho se não se faz com perfeição também humana; e, sem essa perfeição humana, dificilmente – para não dizer de modo algum – se poderá atingir o prestígio profissional, a cátedra da qual se ensine aos demais a santificar esse trabalho e a adaptar a vida às exigências da fé cristã.

É preciso, portanto, utilizar todos os meios necessários para conseguir essa boa instrução profissional e para conseguir que se mantenha atualizada. Temos os mesmos direitos e as mesmas possibilidades que qualquer cidadão: vamos aos centros docentes, públicos ou privados, que ofereçam as máximas garantias de procurar esse bom preparo cultural, tanto se é para um trabalho intelectual como para exercer um ofício manual.

Àquele que puder ser sábio não lhe perdoamos que não o seja; mas não é preciso, nem necessário, que todos o sejais. Pelo contrário, é necessário que todos os membros do Opus Dei sejam doutos, competentes na sua atividade profissional, com prestígio de retidão e de ciência ou arte entre seus colegas.

Coepit Iesus facere et docere95, Jesus começou a fazer e a ensinar: é preciso ensinar, meus filhos, com o exemplo. As pessoas acreditarão na vossa doutrina quando vejam as vossas boas obras96, o vosso modo de agir. O bom exemplo arrasta sempre. Mas, para que seja eficaz, deve ser consequência da simplicidade e da naturalidade com que os membros da Obra sabem viver o que ensinam.

É afirmação feita por cristãos comuns no exercício reto e responsável da sua profissão ou ofício, no cumprimento fiel de todos os seus deveres cívicos, na prática – que é também um dever – de todos os seus direitos, no modo de enfrentar e resolver os problemas diários a as fadigas da vida no mundo: numa palavra, através de todas as suas relações humanas, inspiradas e vividas cristãmente, com um motivo sobrenatural, por amor a Deus e ao próximo.

Por isso, o exemplo que há de dar um membro da Obra, talvez de longe, à distância, não chamará nunca a atenção; mas quem se aproxime dele, quem o trate, não demorará muito para poder dizer: aqui está Cristo. Porque se sentirá comover por esse Christi bonus odor97, que é fragrância da alma em trato contínuo com o Senhor.

Cada um em seu lugar, no seu posto de trabalho, os membros do Opus Dei devem dar com sinceridade, sem subterfúgios nem táticas, a luz cristã que o povo e a rua esperam, porque somos para a rua e para o povo.

O gesto, o olhar, o modo de falar, o modo de ver e de fazer as coisas, o trato com os outros e, em geral, toda a vida e o comportamento dos membros da Obra devem estar acompanhados dessa simplicidade que nasce de serem iguais aos outros homens. No dia em que falsamente pensassem que não somos como eles, a rua e o povo seriam impermeáveis para nós: não poderíamos servir as almas.

É assim que a Igreja estará verdadeiramente presente e com simplicidade em todas as tarefas dos homens: com o testemunho pessoal das suas filhas e filhos, leigos normais – que não são fradescos nem agem como frades – que tornam viva e operante a presença da mensagem cristã.

Apostolado do exemplo realizado com mentalidade laical, através de pessoas que vivem do seu trabalho e que não supõem, portanto, nenhum peso econômico para a Igreja, à qual servem generosamente, sem esperar gratificação ou compensação humana de nenhum tipo.

Haveis de viver, haveis de cumprir a vossa tarefa com a retidão e a nobreza dos que, na sua atuação, fazem valer a sua cidadania e o seu preparo profissional, não o seu catolicismo nem o recurso a nomes de santos ou o adjetivo católico; com a alegria sobrenatural e o otimismo humano de quem está profundamente convicto de que cristianismo não é uma religião negativa nem marginal, mas uma afirmação gozosa em todos os ambientes do mundo: a única doutrina na qual todas as instâncias nobres da vida terrena encontrarão firme fundamento e seguro progresso.

Apoiados neste exemplo de desinteresse franco e eficaz – feito possível, alimentado, pelo trato contínuo com o nosso Pai Deus, pela nossa devoção confiada a Santa Maria, pelo amor à Igreja e ao Romano Pontífice, pela oração e pela mortificação –, deveis procurar cultivar a amizade com vossos colegas de profissão, com as pessoas com que vos relacioneis por qualquer outro motivo.

Agireis dessa forma, filhas e filhos meus, não certamente para usar a amizade como tática de penetração social: isso levaria a perder o valor intrínseco que possui; mas como uma exigência – a primeira, a mais imediata – da fraternidade humana, que os cristãos temos obrigação de fomentar entre os homens, mesmo que sejam diversos entre si.

E, ao mesmo tempo, por amor a Deus: porque a amizade facilita a confidência e, assim, torna possível o apostolado da doutrina, a aproximação dessas almas a Deus, desses amigos cujo bem desejamos.

Não faltará até quem, como Nicodemos – que foi de noite até Jesus98 –, buscará nessa discreta singeleza da amizade, escondida da indiscreta curiosidade das gentes, o modo de vencer respeitos humanos e de procurar a verdade divina por que anela em seu interior.

Bem se pode dizer, filhos da minha alma, que o fruto maior do labor do Opus Dei é o que obtêm seus membros pessoalmente, com o apostolado do exemplo e da amizade leal com seus colegas de profissão: na universidade ou na fábrica, no escritório, na mina ou no campo.

É um trabalho de irradiação, de exemplo e de doutrina, constante, humilde, silencioso, mas eficacíssimo, cujos frutos dificilmente podem refletir as estatísticas.

Esse trabalho apostólico é de tal forma humano que – para quem não penetre na natureza sobrenatural do nosso chamado divino, tão unido ao exercício do trabalho profissional, ou para quem pense que é preciso deixar de ser pessoas comuns para dedicar-se totalmente a Deus – pode dar a impressão de que os membros da Obra são raros, precisamente pelo fato de não sê-lo: pelo fato de serem tão normais, tão iguais em tudo a seus concidadãos, a seus colegas de ofício ou de profissão.

Com efeito, os membros da Obra vivem, se vestem e se ocupam como corresponde à posição social que, por razão do seu trabalho, tem cada um; e têm a naturalidade de se adaptarem, como os outros cidadãos, às justas exigências e circunstâncias do ambiente, com simplicidade e com sinceridade de conduta; isto é, comportam-se externamente igual aos demais cristãos, da mesma forma como se teriam comportado se não houvessem pertencido à Obra.

Não se trata, portanto, de encobrir a própria personalidade ou condição; nem de manter um aspecto externo determinado que não seja aquele que lhes corresponde e que é para eles conatural; nem de agir assim por tática apostólica; nem de adotar camuflagens desnecessárias.

Todas essas esquisitices ou hipocrisias são impossíveis na Obra; poderão acontecer, em todo o caso, naquelas pessoas que tencionam disfarçar-se de leigos ou aparentar de alguma maneira que não são religiosos, laicizando-se – eu conheci alguns – talvez por tática apostólica: perigosa tática, por sinal, que poderia converter-se – porque a sinceridade reclama sempre os seus direitos – numa verdadeira apostasia do estado religioso, organizada com técnicas de perversão intelectual e de costumes.

Abençoai o Deus do céu e confessai-o, celebrai a sua magnificência e aclamai-o na presença de todos os viventes, por tudo o que fez em nosso favor: o segredo do rei é bom silenciá-lo; mas é coisa gloriosa dar a conhecer as obras de Deus99. Nós, filhas e filhos meus, não temos nada a encobrir ou ocultar; a espontaneidade da nossa conduta e do nosso comportamento não pode ser confundida com o segredo por ninguém.

Nunca tive segredos, nem tenho nem terei. Tampouco os têm a Obra: não ficaria bem que os tivesse e eu, que sou o Fundador, não soubesse. O segredo é desnecessário para o Opus Dei: nunca precisou dele, nem precisa agora, nem precisará jamais. O tesouro que Deus depositou em nós, a luz que devemos comunicar, é um segredo em voz alta: porque temos a obrigação, a missão divina, de proclamá-lo por toda a parte.

Mas não esqueçais que este modo simples e natural de viver a nossa vocação se complementa perfeitamente com a sensata discrição sobrenatural que requerem a eficácia do labor e, acima de tudo, a humildade pessoal e coletiva: especialmente agora, nestes primeiros tempos da Obra, que são delicados tempos de gestação.

A intimidade da entrega pessoal a Deus e a intimidade da vida da nossa Família não são coisas para serem apregoadas pela rua, nem para satisfazer a curiosidade do primeiro enxerido agressivo que bata na porta: a nossa ingenuidade deve estar unida à prudência.

Meditai, filhos, nestas claras e estupendas palavras de São Paulo: toda a nossa glória consiste no testemunho, dado pela nossa consciência, de termos procedido neste mundo com simplicidade de coração e sinceridade perante Deus100. Esta é a glória da Obra, e isto é o que cada um de nós há de procurar viver em qualquer situação e circunstância em que se encontre.

A simplicidade e a sincera naturalidade do nosso espírito brilharão também no mundo, perante os homens, se vos esmerais em ser filialmente simples e sinceros no trato com Deus, se continuamente procurais pôr vossos pensamentos, vossas palavras e vossas obras de acordo com a Verdade.

Sinceros também e simples com aqueles que na Obra têm a missão de vos dirigir e de vos formar, para que possam conduzir-vos e ajudar-vos com carinho, com firmeza, com compreensão e com eficácia. Sinceros com delicadeza, mas selvagemente sinceros.

Sem temor de nenhum gênero para manifestar tudo quanto possa facilitar essa direção que vos leva para Deus, melhora o vosso espírito e a vossa formação, cura prontamente qualquer ferida e endireita em tempo qualquer desvio, mesmo que seja grave ou possa parecê-lo: não esqueçais nunca que a única coisa verdadeiramente grave seria ocultar essa ferida ou esse desvio a quem é médico, guia e pastor.

Sinceridade, finalmente, na nossa vida de família. Porque a conduta espontânea e aberta é um meio eficacíssimo para tornar amável e verdadeiramente cordial o vosso trato mútuo e para facilitar que vos possais ajudar sempre: também, quando for necessário, com a correção fraterna.

O apostolado da Obra – precisamente porque está empapado de uma real fraternidade – deve tender a criar ao nosso redor, fomentando a compreensão recíproca, um ambiente de paz e de serena convivência, que remova os possíveis obstáculos – quantos, ainda! – que se oponham à unidade dos homens entre si e com o Senhor.

Portanto, é alheio ao espírito da Obra tudo o que signifique uma limitação, um rebaixamento provinciano ou egoísta da visão cristã do mundo, dos homens e das coisas. Fazemos nosso o ensinamento de São Paulo aos de Corinto, referindo-se à unidade da Igreja, figura da unidade de todo o gênero humano: somos batizados em um mesmo espírito para formar um só corpo, quer sejamos judeus, quer gentios, quer escravos, quer livres, e todos bebemos de um mesmo Espírito101.

Esta entranha efetivamente católica do Opus Dei exige de nós um ânimo grande, universal, capaz de extrair tantas coisas boas do tesouro do nosso coração – de bono thesauro profert bona102 –, para superar e derrubar as numerosas barreiras mentais e psicológicas que os homens opõem à fraternidade dos filhos de Deus.

Uma dessas barreiras – talvez a mais perniciosa, nesta época histórica do mundo – é o nacionalismo, que dificulta a compreensão e a convivência, que é incompatível com o autêntico amor à própria pátria e que é um grande obstáculo para a procura do bem comum da sociedade humana.

O maior exagero, a dificuldade mais nociva, ocorreria se esse nacionalismo fosse levado às coisas de Deus, que é onde principalmente deve resplandecer a união de tudo e de todos no amor de Jesus Cristo103.

A realidade desta união na caridade cristã deve manifestar-se em obras – em todo o âmbito da sociedade dos homens – e não admite o classismo, menos ainda o espírito de casta ou de seita: já não há distinção de judeu, nem de grego, nem de servo, nem de livre; nem tampouco de homem, nem de mulher; porque todos vós sois uma só coisa em Jesus Cristo104.

Conseguir esta unidade e fazer com que perdure é tarefa difícil, que se alimenta de atos de humildade, de renúncias, de silêncios, de saber escutar e compreender, de saber interessar-se nobremente pelo bem do próximo, de saber desculpar sempre que for preciso: de saber amar verdadeiramente, com obras.

Para esta grande tarefa cristã devemos contribuir nós com um decidido empenho apostólico, fazendo com que todos os que se aproximem da Obra se sintam movidos a trabalhar em favor dessa unidade, da mútua compreensão que leva à convivência e ao bem-estar humano, espiritual e material.

Na Igreja e na sociedade civil não existem fiéis nem cidadãos de segunda categoria. Tanto no apostólico como no temporal, são arbitrárias e injustas as limitações à liberdade dos filhos de Deus, à liberdade das consciências ou às iniciativas legítimas. São limitações que procedem do abuso de autoridade, da ignorância ou do erro dos que pensam que podem permitir-se o abuso de fazer discriminações nada razoáveis.

Este modo injusto e antinatural de proceder – porque é contrário à dignidade da pessoa humana – não pode ser nunca caminho para a convivência, porque asfixia o direito do homem de agir segundo a sua consciência, o direito de trabalhar, de associar-se, de viver em liberdade dentro dos limites do direito natural.

Filhas e filhos meus, somos amigos de trabalhar pacificamente com todos, justamente porque estimamos, respeitamos e defendemos em todo o seu enorme valor a dignidade e a liberdade que Deus deu a cada criatura racional, desde o mesmo momento da Criação; e, mais ainda, desde que o próprio Deus não hesitou em assumir a natureza humana, e o Verbo se fez carne e habitou entre os homens105.

Daí que o nosso empenho em tratar todas as pessoas – ninguém nos é indiferente, porque tampouco o foi para Cristo – deve estar sempre presidido por uma fina delicadeza humana, que supere as meras formas sociais, pois é uma manifestação da nossa mesma fé.

Dessa forma, compreende-se bem que este espírito da Obra há de atrair o carinho e a ajuda de tantos não católicos, e mesmo não cristãos, entre os quais havereis de viver, tendo-os como companheiros de trabalho, como amigos seguros.

Caminhemos na verdade e na caridade: a nossa fidelidade leal ao depósito da fé, ao Magistério da Igreja, far-nos-á portadores de verdade, veritatem facientes in caritate106, ensinando a doutrina do Evangelho com a caridade de Jesus Cristo.

Quando não for possível transigir, a intransigência deve ser santa e, portanto, sê-lo-á com a doutrina, não com as pessoas: de outro modo, não poderemos levá-las a Deus, nem sequer será fácil tratá-las fraternalmente, como exige a nossa condição de cristãos. Não se pode ceder no que é de fé: mas não esqueçamos que, para falar a verdade, não é preciso maltratar ninguém.

Se alguma vez, excepcionalmente, pela desfaçatez e violência do interlocutor, é preciso dizer as coisas com energia, neste caso, para evitar que as nossas palavras machuquem – irascimini et nolite peccare107, embora falemos duramente, não nos deixemos levar pela paixão –, será preciso lançar logo sobre as feridas o bálsamo da caridade e curar, sarar, explicando que era necessário proceder assim naquele momento.

Maior ainda, se possível, deve ser esse respeito por cada pessoa e pela sua liberdade quando se trate de contrastes em questões opináveis. Infelizmente, há entre os homens tanta tendência ao totalitarismo, à tirania, ao fanatismo das próprias opiniões em matérias discutíveis, que devemos esforçar-nos muito para dar exemplo – em toda parte – do nosso amor à liberdade pessoal de cada um.

Sempre utilizei para mim este raciocínio, que deveis também fazer vós e ensiná-lo aos demais: se o Senhor deixou tantas coisas à livre disputa dos homens, por que há de ser meu inimigo um homem que pense de forma diversa de mim?

Se não temos as mesmas ideias e me convence, aceitarei a sua opinião: se eu o convenço, pensará como eu; se nenhum dos dois convence o outro, poderemos sempre respeitar-nos, querer-nos bem, conviver em paz.

Tribue sermonem compositum in ore meo108, põe na minha boca palavras apropriadas na presença de quem te contradiz. Não sai a luz da disputa violenta, da discussão: a paixão impede-o. Por isso é preciso saber escutar o interlocutor e falar serenamente, ainda que isso suponha às vezes um esforço interior de domínio, de mortificação meritória, porque esse ato tem já uma razão sobrenatural que o valoriza.

Não tenhais dúvida de que, por vezes, pensa-se ter toda a razão e só se tem uma razão parcial, relativa; um objeto que para uns é côncavo, para outros é convexo: depende apenas do ponto de vista. É justo, portanto, estudar com calma, friamente, as razões dos demais e considerar a posição mental de quem nos contradiz.

Vivendo em amizade com Deus – a primeira que devemos cultivar e acrescentar –, sabereis fazer muitos e verdadeiros amigos109: o labor que o Senhor fez e faz continuamente conosco, para nos manter nessa amizade com Ele, é o mesmo labor que quer fazer com muitas outras almas, servindo-se de nós como instrumentos.

Já vos disse, meus filhos, que acredito na amizade humana: amico fideli, nulla est comparatio110, nada é comparável ao amigo fiel. A amizade é um tesouro que devemos estimar pelo seu grande valor humano e aproveitar como meio para levar almas a Deus.

Posso dizer-vos que me sinto amigo de todo o mundo, como também vós deveis sentir-vos, porque buscamos o bem de todas as almas sem exceção. Mesmo que um homem esteja muito afastado do Senhor, mesmo que manifeste muito a sua inimizade, devemos pensar com Santo Agostinho que não devemos desesperar da sua conversão, porque mesmo entre os que são abertamente adversários se ocultam amigos predestinados, embora nem eles o saibam111.

O amigo verdadeiro não pode ter duas caras para o seu amigo: a amizade, se há de ser leal e sincera – vir duplex animo inconstans est in omnibus viis suis112; o homem falso, de ânimo duplo, é inconstante em tudo –, exige renúncias, retidão, troca de favores, de serviços nobres e lícitos. O amigo é forte e sincero na medida em que, de acordo com a prudência sobrenatural, pensa generosamente nos outros, com sacrifício pessoal.

Espera-se do amigo a correspondência ao clima de confiança que se estabelece com a verdadeira amizade; espera-se o reconhecimento do que somos e, quando necessária, também uma defesa clara e sem paliativos: porque, como há pouco tempo li num texto castelhano, quando o amigo defende ou louva com tibieza, é testemunha maior de toda exceção, confessando simplesmente que não encontra aspectos para louvar nem razão para defender: porque, se houvesse, quem qual um amigo as defenderia e celebraria?

Podem me dizer: os amigos, por vezes, atraiçoam. No entanto, agindo sempre com retidão de intenção, com sentido sobrenatural, não vos podem preocupar nem desanimar as possíveis surpresas, nem essas exceções devem impedir o vosso desejo eficaz de ter uma nobre inclinação limpa e afetuosa para com todos.

113É verdade que é melhor confiar em Deus do que nos homens, bonum est confidere in Domino, quam confidere in homine114. Digo-vos, porém: depositai acima de tudo a vossa confiança em Deus, mas tende também confiança nos vossos irmãos. Com a vossa caridade, com a vossa compreensão, semeando sempre com a devida prudência – mas de mãos cheias – a segurança à vossa volta, fazei difícil, impossível, que os homens não se sintam obrigados a corresponder à aberta caridade do vosso trato.

Ao mesmo tempo, com o respeito e o amor que professamos pela liberdade das consciências, através deste apostolado da confidência e da amizade, entrai na vida dos demais – como Jesus Cristo entrou na nossa – e fazei proselitismo incansavelmente: para que ninguém com vocação para a Obra possa desculpar-se como os trabalhadores da parábola: quia nemo nos conduxit115, porque ninguém lhes disse nada.

Pensai, além disso, que temos o direito e o dever de assegurar, a esta maravilhosa Família nossa, todos os filhos que o Senhor têm dispostos desde a eternidade: para que perdure enquanto houver homens sobre a terra, para que Jesus Cristo tome posse de tantas almas que têm fome e sede de Deus116.

Estou concluindo, meus filhos. Já vos dizia, no começo desta carta, que a minha intenção era só recordar-vos alguns pontos do espírito sincero e simples que o Senhor, Bondade infinita – que supera a pequenez dos instrumentos que emprega –, deu-me para vós. Deus, nosso Pai, quer que aprendais bem este espírito, que o tornemos profundamente nosso, que o vivamos.

É essa vida – a vida da Obra – que abrirá a seu tempo o necessário caminho jurídico, a norma de direito, que esperamos com confiança. As plantas que nascem de baixo, como o Opus Dei, devem abrir passagem por si próprias, com a suave violência da vida, protegidas pelo cuidado e a solicitude do jardineiro – Jardineiro divino é o nosso –, que põe alimento nas raízes e garante o desenvolvimento necessário, ao ar livre e à luz do sol.

As características tão peculiares desta nossa vocação trazem consigo a presença e a solução – com fórmulas adequadas – de muitos problemas de caráter teológico, ascético, jurídico, os quais necessariamente hão de levar tempo e dar trabalho; também porque muitas pessoas, até com boa vontade e com competência determinada nas diversas manifestações do apostolado e da vida da Igreja, demorarão para compreender-nos: já vo-lo disse.

Mas, sobretudo, porque esta realidade social e apostólica que Deus promoveu no seio da Igreja propõe problemas que são muito diferentes – também no modo de apresentá-los – dos problemas próprios do estado religioso; e mesmo que, aos que não compreendem o nosso caminho, pareça por vezes que alguns problemas são comuns, as soluções, inevitavelmente, hão de ser diferentes.

Convictos como estamos da natureza sobrenatural da Obra de Deus, devemos conseguir que a forma jurídica responda plenamente ao espírito que estamos vivendo. Não podemos vestir um terno alheio; devemos vestir um terno feito sob medida, sem que essa necessidade suponha, de modo algum, desejo de singularizar-se: isto é condição indispensável para assegurar a nossa vida interior e para a nossa própria perseverança, bem como para a autêntica eficácia espiritual da Obra em serviço da Igreja.

Só assim poderemos corresponder generosamente e fielmente à vocação específica que recebemos; só deste modo será factível cumprir a tarefa que nos foi encomendada, com meios ascéticos e formas apostólicas que respondam plenamente aos fins próprios da nossa vocação. Portanto, digo a cada um de vós: caminante, no hay camino; se hace camino al andar117.

Desta forma, evitar-se-á também que, por medo, por pensar que viemos competir com outras instituições apostólicas que trabalham na Igreja, num temor totalmente infundado, existam – estamos padecendo-o – os que se sintam movidos a colocar obstáculos ao nosso labor, opondo-se à nossa liberdade de filhos de Deus e comprometendo a admirável unidade e variedade do apostolado da Igreja, riqueza multiforme do Espírito do Senhor.

O céu está empenhado, meus filhos, em que a Obra se realize. As dificuldades humanas – pensai, por exemplo, na dolorosa experiência dos três anos de guerra civil na Espanha; ou na nova guerra mundial, que parece ameaçar a expansão da Obra por outros países e outros continentes – são dificuldades que não puderam nem poderão frear o vigor e o alcance do nosso trabalho sobrenatural.

Tampouco a absoluta pobreza em que vivemos, a falta, por vezes, dos meios humanos mais indispensáveis, são obstáculos ou dificuldades que valha a pena considerar: antes, constituem um poderoso estímulo e acicate, porque esta escassez de recursos representa uma prova externa a mais de que verdadeiramente seguimos as pegadas de Cristo.

Menos ainda poderão deter-nos, ou diminuir a firmeza do nosso passo – vamos ao passo de Deus –, as dificuldades de compreensão que o nosso caminho encontre, pois ninguém pode frear uma impaciência santa, divina, por servir à Igreja e às almas.

Aumentai, pois, a vossa fé e a vossa confiança em Deus. E tende também um pouco de fé e de confiança no vosso Padre, que vos garante que procedeis na verdade, obedecendo à Vontade do Nosso Senhor, e não à débil vontade de um pobre sacerdote... que não queria, que não pensou nem desejou nunca fazer uma fundação.

Escutai o que o Senhor faz dizer a São Paulo: Por isso não desanimamos deste ministério que nos foi conferido por misericórdia. Afastamos de nós todo procedimento fingido e vergonhoso. Não andamos com astúcia, nem falsificamos a palavra de Deus. Pela manifestação da verdade nós nos recomendamos à consciência de todos os homens, diante de Deus.

Se o nosso Evangelho ainda estiver encoberto, está encoberto para aqueles que se perdem, para os incrédulos, cujas inteligências o deus deste mundo obcecou a tal ponto que não percebem a luz do Evangelho, onde resplandece a glória de Cristo, que é a imagem de Deus.

De fato, não nos pregamos a nós mesmos, mas a Jesus Cristo, o Senhor. Quanto a nós, consideramo-nos servos vossos por amor de Jesus. Porque o Deus que disse: Das trevas brilhe a luz, é também aquele que fez brilhar a sua luz em nossos corações, para que irradiássemos o conhecimento do esplendor de Deus, que se reflete na face de Cristo118.

Portanto, filhas e filhos da minha alma, rezai e sede fiéis – multum enim valet deprecatio iusti assidua119 –, pois a oração vale muito e foi, e há de ser sempre, a nossa grande arma. Trabalhai e estai alegres, serenos e seguros, na correspondência à vossa vocação, ao espírito simples e sincero do Opus Dei: filii lucis estis et filii diei120, todos vós sois filhos da luz e filhos do dia, e no meio da claridade da rua caminhamos sob o resplendor do sol.

Quando penso em vós e nos vossos desejos de fidelidade – e vos tenho continuamente presentes! –, sinto a necessidade de vos repetir com palavras da Sagrada Escritura: grande é a confiança que tenho em vós, e muitos são os motivos para gloriar-me em vós; estou inundado de consolo, transbordo de gozo no meio de todos os meus trabalhos121.

Como é bom o Senhor, que nos procurou, que nos fez conhecer esta maneira santa de sermos eficazes, de entregar a vida com simplicidade, de amar todas as criaturas em Deus e de semear a paz e a alegria entre os homens! Jesus, como és bom, como és bom! Iesu, Iesu, esto mihi semper Iesus!

Peço a Deus, meus filhos, que essa alegria e essa paz, em união com Jesus Cristo, Senhor Nosso, e com Santa Maria, Nossa Mãe, vos acompanhem sempre.

Abençoa-vos no Senhor o vosso Padre.

Madri, 11 de março de 1940

Notas
1

Jr 10, 10.

2

Cf. Rm 3, 4.

3

Cf. Jo 14, 6.

4

Gl 4, 19

5

São João Crisóstomo, In Matthaeum homiliae 1, 5 (PG 57, col. 20).

Referências da Sagrada Escritura
Notas
6

1 Jo 3, 2.

7

Cf. Gn 2, 1.

8

Gn. 1, 31.

9

Gl 4, 5.

10

Cf. Rm 6, 4-5.

11

Cf. Ef 1, 9-10.

12

Cf. Cl 1, 20.

13

Ef 5, 1

Referências da Sagrada Escritura
Notas
14

1 Jo 3, 1.

15

Cf. Jo 1, 14.

16

Jo 1, 4.

17

Cf. Jo 1, 5.

18

Jo 1, 5

19

Cf. 1 Jo 4, 8.

20

Cf. Lc 12, 49.

21

1 Jo 1, 3-4.

Referências da Sagrada Escritura
Notas
22

1 Cor 4, 7.

23

1 Jo 1, 8.

24

1 Jo 2, 1-2.

25

Ef 3, 17-18.

Referências da Sagrada Escritura
Notas
26

1 Jo 2, 6.

Referências da Sagrada Escritura
Notas
27

1 Jo 2, 7-11.

28

Cf. Rm 5, 5.

29

Jo 17, 23.

30

Jo 13, 34.

31

Pr 18, 19.

Referências da Sagrada Escritura
Notas
32

2 Cor 5, 14.

33

Cf. 1 Jo 3, 18.

34

Cf. 1 Jo 4, 20.

35

Cf. Jo 3, 16.

Referências da Sagrada Escritura
Notas
36

Rm 8, 14-17.

37

Sl 2, 8.

38

1 Cor 3, 22-23.

Referências da Sagrada Escritura
Notas
39

Mt 5, 14.16.

Referências da Sagrada Escritura
Notas
40

“Simples contrato”: veja-se o Glossário.

41

Rm 6, 22.

42

Cf. Lv 6, 12.

43

Mt 11, 28.

44

Ap 3, 20.

45

Ap 22, 12.

46

Cf. Mt 11, 12.

47

Lc 24, 29.

Referências da Sagrada Escritura
Notas
48

Sobre o conceito de “alma sacerdotal”, veja-se o Glossário.

49

Cf. Jo 17, 22.

50

Jo 17, 11.15-16.

Referências da Sagrada Escritura
Notas
51

Jo 12, 32.

Referências da Sagrada Escritura
Notas
52

Cf. Gn 2, 15.

Referências da Sagrada Escritura
Notas
53

Mt 5, 48.

Referências da Sagrada Escritura
Notas
54

1 Rs 3, 9.

Referências da Sagrada Escritura
Notas
55

Cl 3, 23-24.

56

Gl 4, 31.

Referências da Sagrada Escritura
Notas
57

Ef 2, 19.

Referências da Sagrada Escritura
Notas
58

Jo 7, 5.

Referências da Sagrada Escritura
Notas
59

Sobre o significado de “luta ascética” em São Josemaria, veja-se o Glossário.

60

Jo 16, 30: “agora vemos que tu sabes tudo”.

61

Ef 5, 8.

62

2 Cor 12, 9.

63

Tertuliano, Apologeticum, 50, 3 (FC 62, p. 296).

Referências da Sagrada Escritura
Notas
64

Jo 14, 6

65

Cf. Mt 16, 24.

66

Cf. 1 Cor 7, 7.

Referências da Sagrada Escritura
Notas
67

Sobre as ocupações temporais dos religiosos, veja-se a nota no Glossário.

Notas
68

1 Cor 5, 6.

Referências da Sagrada Escritura
Notas
69

Sobre o significado de “perfeição cristã” em São Josemaria, veja-se o Glossário.

Notas
70

1 Ts 4, 3.

Referências da Sagrada Escritura
Notas
71

Sobre o significado de “não haverá opiniões”, veja-se o Glossário.

72

Jo 17, 23.

Referências da Sagrada Escritura
Notas
73

Mt 6, 18. “Teu Pai, que vê o oculto, recompensar-te-á”.

74

Is 43, 1. “Eu te redimi e te chamei pelo teu nome: tu és meu”.

Referências da Sagrada Escritura
Notas
75

Sl 19 (18), 6-7.

76

Sl 77 (76), 15.

77

Tg 1, 16-17.

Referências da Sagrada Escritura
Notas
78

Ez 1, 14.

79

Ct 7, 13.

80

Mt 13, 52.

Referências da Sagrada Escritura
Notas
81

Jo 3, 8.

Referências da Sagrada Escritura
Notas
82

Sl 25 (24), 3.

Referências da Sagrada Escritura
Notas
83

Sl 103 (102), 5. “Que sacia de bens a tua existência: a tua juventude renovar-se-á como a da águia”.

84

Sl 96 (95), 1.

Referências da Sagrada Escritura
Notas
85

São Justino, Apologia pro christianis I, 14 (SC 507, pp. 162-165).

Notas
86

Fl 1, 8.

Referências da Sagrada Escritura
Notas
87

Sobre as diferenças com as associações, veja-se o Glossário.

Notas
88

Sl 88 (87), 2-3.

89

Sl 104 (103), 10.

Referências da Sagrada Escritura
Notas
90

Sobre o episódio ocorrido em Burjasot, veja-se o Glossário.

91

At 19, 2.

Referências da Sagrada Escritura
Notas
92

Cf. Mt 11, 25.

93

Cf. At 2, 4-6.

94

Cf Jo 7, 38.

Referências da Sagrada Escritura
Notas
95

At 1, 1.

96

2 Pe 1, 10.

97

2 Cor 2, 15.

Referências da Sagrada Escritura
Notas
98

Cf. Jo 3, 1-3.

Referências da Sagrada Escritura
Notas
99

Tb 12, 6-7.

Referências da Sagrada Escritura
Notas
100

2 Cor 1, 12.

Referências da Sagrada Escritura
Notas
101

1 Cor 12, 13.

Referências da Sagrada Escritura
Notas
102

Mt 12, 35.

103

Cf. 1 Cor 10, 17.

Referências da Sagrada Escritura
Notas
104

Gl 3, 28.

Referências da Sagrada Escritura
Notas
105

Cf. Jo 1, 14.

Referências da Sagrada Escritura
Notas
106

Cf. Ef 4, 15.

107

Sl 4, 5; Ef 4, 26.

Referências da Sagrada Escritura
Notas
108

Est 14, 13.

Referências da Sagrada Escritura
Notas
109

Eclo 6, 17.

110

Eclo 6, 15.

111

Santo Agostinho, De civitate Dei, I, c. 35 (CChr.SL 47, p. 33).

Referências da Sagrada Escritura
Notas
112

Tg 1, 8.

Referências da Sagrada Escritura
Notas
113

Sobre o significado do “proselitismo” em São Josemaria, veja-se o Glossário.

114

Sl 118 (117), 8.

115

Mt 20, 7.

116

Cf. Jo 6, 35.

Referências da Sagrada Escritura
Notas
117

Caminhante, não há caminho; faz-se caminho ao andar. Antonio Machado, Campos de Castilla, ed. de José Luis Cano, “Proverbios y cantares”, XXIX, ed. Cátedra, Madri, 1984.

Notas
118

2 Cor 4, 1-6.

Referências da Sagrada Escritura
Notas
119

Tg 5, 16.

120

1 Ts 5, 5.

121

2 Cor 4, 4.

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